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Falsificações e contrabandos

Relatos de arapongas do Itamaraty revelam que militantes brasileiros de esquerda no exterior abriram empresas de fachada e tinham até ligações com a máfia italiana

Claudio Dantas Sequeira
Da equipe do Correio Braziliense

Os seqüestros políticos e os atentados à bomba eram consideradas ações legítimas pelas lideranças contrárias ao regime militar brasileiro. Na lógica da guerra irregular, buscavam a libertação de prisioneiros ou a comoção social para desestabilizar a ditadura. Muitos asilados brasileiros, no entanto, foram além das ações políticas, enveredando pelo caminho da ilegalidade. Informes produzidos pelo Centro de Informações do Exterior (Ciex), do Itamaraty, mostram o envolvimento de opositores em atividades como contrabando de armas, falsificação de dinheiro e passaportes, e até a abertura de empresas e associações de fachada. Atividades que integraram a rotina da resistência.

O informe nº 470/69, por exemplo, acusa Manuel Soares Leães (Maneco), então piloto de João Goulart, de usar os aviões de propriedade do ex-presidente para “contrabando de armas brasileiras, inclusive metralhadoras INA”. No Uruguai, ele “as venderia a elementos da organização terrorista Tupamaros”. Os movimentos guerrilheiros latino-americanos também estariam juntos na negociação de dólares falsos. O informe nº 036/76 dá conta da apreensão em província do norte argentino de uma gráfica de dólares falsos. A maquinaria, segundo o documento, “teria sido usada no Chile durante o governo de Salvador Allende, tendo sido posteriormente transferida para a Argentina”.

No informe nº 283, de 5 de junho de 1972, um agente infiltrado diz que Joaquim Pires Cerveira confidenciou a ele que viajaria em breve para a Itália com o objetivo de buscar fundos a serem doados pelo Partido Comunista Italiano. “Cerveira teria revelado ainda que possui um contato no aeroporto de Roma, membro da máfia e que o tem utilizado para fazer contrabando de jóias”, garante o informante. O informe nº 470 de 2 de dezembro destaca que os brasileiros Ricardo da Costa e Roberto da Cunha participaram de fabricação e distribuição de moeda falsa. Eles teriam se associado a um argentino chamado Ferreyro Pentado.

“Fábrica”

Boa parte das acusações dos agentes é claramente fruto de especulações, sem dados concretos. É o que ocorre, por exemplo, com a denúncia de que Clara Scharf, ex-mulher de Carlos Marighela, teria montado na Itália, “juntamente com outros latino-americanos, uma fábrica de documentos e passaportes falsos”. “No futuro, pretende falsificar também dólares americanos”, especula o agente no informe nº 353, de 4 de outubro, algo que nunca se comprovou. No informe de 23 de dezembro de 1968, por exemplo, o agente imagina que Maria Teresa Goulart “estaria em preparativos para montar uma ‘boutique’ no balneário de Punta del Este (Uruguai), com mercadorias trazidas de contrabando do Brasil e da Argentina”.

Muitas vezes, os brasileiros montavam, com a ajuda de estrangeiros, empresas ou organizações de fachada com a finalidade de escoar recursos financeiros ou permitir a realização de atividades políticas no exílio. Órgãos de pesquisa e agências de viagens eram os preferidos. O informe nº 664, de 14 de dezembro de 1972, relata que asilados e refugiados radicados no Chile “receberam do governo chileno, através do Banco del Estado do Chile, com cobertura da firma Ferreira & Cia — cujo presidente é o refugiado brasileiro José Ferreira Cardoso — o montante de 1 milhão de escudos”, correspondentes a US$ 3,3 mil.

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