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Empresário revela caminho da corrupção



LILIAN CHRISTOFOLETTI
da Folha de S.Paulo

Durante oito anos, o construtor Antonio José Cressoni, 51, diz que ganhou cerca de R$ 16,5 milhões por dezenas de obras que realizou e por outras que não existiram. Tinha como único cliente a Prefeitura de São Caetano do Sul (SP) e, afirma, conseguiu o feito sem disputar uma concorrência pública.

Com cartas pessoais, ordens de pagamento com o timbre municipal e fotos ao lado de autoridades locais -- na praia e em cruzeiros --, Cressoni procurou o Ministério Público para denunciar o suposto grupo que o teria ajudado de forma ilegal a ganhar dinheiro e o "abandonado" depois, ser mais nenhuma obra pública realizada.

O empreiteiro diz que perdeu todo o dinheiro que ganhou comprando material para obras, pagando mão-de-obra e com agrados a funcionários públicos, como viagens, jantares e reformas em imóveis particulares. Cressoni entregou uma lista de casas, fazendas e apartamentos que teriam sido reformados de graça. "Atendia aos pedidos. Se não fosse assim, não teria mais nenhuma obra."

Segundo ele, três obras fantasmas de gestões anteriores não compensaram o dinheiro gasto com esses "presentes".

"Recebi por obras que nem foram feitas. Não achava errado. Era uma compensação pelas coisas que fiz de graça."

Agora ele tenta provar que, após ser alçado à vida de empresário rico, foi "enganado" e levado à bancarrota.

A aproximação de Cressoni com o mundo político começou em 1992, quando passou a freqüentar um bar, em frente à antiga sede da prefeitura, onde conheceu os ex-prefeitos do PTB, Luiz Tortorello, Antonio Dall'Anese e Walter Braido.

Em 1996, com dificuldade financeira, pediu ao padre Geraldo Voltollini, que tinha "prestígio" junto a Dall'Anese, que intercedesse por ele -- em depoimento ao Ministério Público, o padre confirmou ter recomendado o empresário ao prefeito.

Cressoni conseguiu a primeira obra pública, a reforma de uma quadra esportiva, por cerca de R$ 140 mil, sem licitação. Ganhou mais dois serviços de valores similares. Ao final da gestão, ficou com um saldo de R$ 16 mil a receber.

"Fiquei desiludido. Quando Tortorello assumiu a prefeitura, fui procurado pelo engenheiro do município José Gaino, que me propôs um pacto."

O "pacto", diz Cressoni, consistia em receber os valores em atraso e ganhar obras em concorrências dirigidas. Em contrapartida, teria de devolver, em dinheiro, 15% de cada cheque emitido pela prefeitura.

A quantia ficaria num suposto "fundo de reserva", espécie de conta caução. Se, após dois anos, a obra estivesse regular, o empresário resgataria o valor.

Em caso de obra da Secretaria da Saúde, afirma, teria de entregar mais 10%, como uma suposta exigência do ex-titular da pasta e hoje prefeito da cidade, José Auricchio Jr. (PTB).

"Gaino disse que quem descumpria o pacto não tinha mais obra da prefeitura. E eu aceitei as cartas-convites."

Convite é uma modalidade prevista na Lei de Licitações, para contrato inferior a R$ 150 mil, que exige a participação de ao menos três empresas. Ganha quem oferecer o menor preço.

"Das cem obras que fiz, assinei 11 convites sem nunca ter apresentado um orçamento."

De 1997 a 2006, Cressoni calcula ter recebido pelo menos R$ 16,5 milhões. O atual prefeito, que nega ter exigido dinheiro do empresário, afirma não saber o valor exato.

A cada cheque, Cressoni diz que cumpria um ritual: "Retirava a ordem de pagamento e o cheque na tesouraria da prefeitura. No posto do Banespa, que ficava no mesmo prédio, depositava o valor na minha conta. Depois, ligava para o gerente do meu banco e lhe pedia que reservasse o dinheiro do fundo."

No dia seguinte, diz, confeccionava a nota fiscal, que deixava na tesouraria, e sacava os 15%. "Dava o dinheiro para Gaino. Outras vezes, para o ex-chefe-de-gabinete Antonio de Pádua, irmão de Tortorello."

Segundo a prefeitura, o cheque só é entregue após a apresentação de nota fiscal. Documentos públicos, porém, apontam o inverso. Para uma ordem de pagamento do dia 2 de fevereiro de 2004, há uma nota fiscal com carimbo de recebimento de dois dias depois.

Foram obras fantasmas, afirma, a ampliação de um centro médico, o calçamento de uma avenida e a execução de parte da infra-estrutura do estádio Anacleto Campanella. Só do centro, diz, ganhou R$ 218 mil.

Questionado se denunciaria o esquema se ainda tivesse obras públicas, ele respondeu: "Mas eles me abandonaram".

Comentários

Luiz Maia disse…
Espero que mais cidadãos caiam em si e denunciem os roubos praticados por políticos corruptos. Eu abomino o "jeitinho brasileiro", coisa de povinho subdesenvolvido e corrupto.

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