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Aceleração só no papel



O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) é citado pelo presidente Lula em quase todo discurso. Tema predileto da ministra Dilma Rousseff, presidenciável para 2010, ancora incontáveis eventos. Nesses palanques, o programa destravou o Brasil. Longe deles, obras atrasam e medidas essenciais para o crescimento, ainda mais durante uma crise global, ficam engavetadas. É o que você confere nesta série de reportagens, que vai até terça-feira. Os textos são dos repórteres Giovanni Sandes e Renato Lima.

O tão propalado Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), em Pernambuco, tem previstos R$ 31,4 bilhões, mas, em seu segundo ano, ainda tem a impressionante marca de 99,94% obras incompletas. O dado consta em levantamento do próprio governo estadual. Embora renda muito discurso político, o PAC compila poucas inaugurações de verdade, mesmo tendo em sua lista praticamente de tudo, de redutor eletrônico de velocidade, as lombadas eletrônicas, até abastecimento de água nas escolas.

O PAC foi apresentado no início do segundo mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva como uma forma de gestão diferenciada de projetos públicos. Combinado com mudanças legais, o programa aceleraria o crescimento sustentável do País. Na época, o Brasil se beneficiava do boom do crescimento mundial, mas ostentava histórico, nesse aspecto, de resultados abaixo de outros países em desenvolvimento. Projetos públicos já existentes ou ainda em concepção foram embalados e somados com projetos privados: surgia um arrojado programa de investimentos, que trazia em seu bojo importantes medidas institucionais.

Desde o início, o PAC pernambucano apresentou números elevados, por incluir relevantes projetos privados já em execução ou anteriormente previstos, como o Estaleiro Atlântico Sul, em Suape.

Pernambuco, no entanto, também foi contemplado com uma boa fatia de obras públicas, especialmente na área hídrica, como o sistema adutor de Pirapama, de R$ 430 milhões. Os gestores do Estado comemoraram. Mas, com apenas 0,06% do PAC concluído em Pernambuco, a aceleração ficou só no nome do programa. Projetos com cifras enormes e especialmente significativos para o Nordeste e Pernambuco acumulam atrasos: a transposição do Rio São Francisco, orçada em R$ 4,69 bilhões (sem contar com a revitalização do rio, estimada em R$ 1 bilhão), e a ferrovia Transnordestina, de R$ 5,4 bilhões. Mesmo nacionalmente, só 8% das obras do PAC foram concluídas e “em ritmo adequado de execução” estão outros 88%. Até o que aparece “em andamento”, no papel, nem sempre condiz com a realidade.

Uma das exigências do governo federal para liberar recursos para a Transnordestina Logística (atual nome da concessionária da Malha Nordeste) viabilizar a famosa ferrovia foi a recuperação da Linha Tronco Sul, atingida em vários pontos por uma enchente, em 2000. A Transnordestina
propriamente dita prevê 1.728 quilômetros de trilhos, de Eliseu Martins (PI) aos portos de Pecém (CE) e Suape (PE). Na obra serão aportados, em recursos públicos, R$ 4,6 bilhões.

Em 4 de maio de 2006, a concessionária requereu ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) as licenças para as obras na Linha Tronco Sul, avaliadas em R$ 100 milhões. São 550 km de Suape, no Cabo de Santo Agostinho, a Propriá, em Sergipe, que integravam o Nordeste ao sul do País.

No balanço de dois anos do PAC, comandado pela ministra-chefe da Casa Civil e presidenciável Dilma Rousseff, a linha consta como 67% recuperada. Mas, além da grande quantidade de mato nos trilhos, pontilhões continuam caídos e a “recuperação” se resume a dormentes novos ao lado dos antigos, podres, em quantidade e padrão irregulares. Em seis localidades visitadas pelo JC, muita madeira recém-colocada já foi trocada e, ainda assim, apresenta várias rachaduras.

Em Palmares, Mata Sul, o supervisor administrativo aposentado da antiga Rede Ferroviária Federal (RFFSA), Pedro Carneiro, 68 anos, 31 deles na RFFSA, diz que a madeira foi colocada há menos de dois meses. Ele vive no limite da área dos trilhos, perto da antiga estação municipal.

“Colocaram uns dormentes, mas de Catende para lá (sentido Alagoas) não passa nada. O pontilhão que caiu em 2000 continua do mesmo jeito”, conta. A reportagem foi lá e confirmou o que disse Pedro.

A 210 km da capital, no limite com Alagoas, Agreste Meridional, está um isolado distrito de Canhotinho chamado Paquevira, onde fica a última estação da Tronco Sul em Pernambuco. Lá, tranquila, a agricultora Isabel Rodrigues da Silva, 62 anos, e sua neta Carla Paulina da Silva, 10 anos, costumam amarrar nos trilhos pequenas ovelhas, que engordam comendo o mato que cresce em meio aos trilhos. “Passa uma ‘trolha’ carregando trabalhador e madeira uma vez na semana. Só não sei quando o serviço acaba. Colocaram dormente novo pior que a madeira velha. Aqui, trocaram há oito meses, mas está tudo rachado, meio podre”, afirma Isabel.

Longe da casa da agricultora, na outra extremidade do Estado, a esperança para a expansão do agronegócio em Petrolina, no Sertão do São Francisco, já teve vários diferentes prazos de lançamento. É o Projeto Pontal, aguardada primeira parceria público-privada federal e que já animou muitos investidores, pelo menos antes da crise do Vale do São Francisco, fortemente atingido pela queda nas exportações.

Desde 2006 espera-se a licitação, de onde sairá uma empresa ou grupo para completar e manter a infraestrutura do perímetro irrigado de 7.473 hectares, em que a União já gastou R$ 235 milhões desde 1996 e nunca ficou pronto. O projeto prevê que o vencedor destine no mínimo 25% da área a produtores de pequeno porte, que serão integrados ao negócio.

O Pontal espera a licença ambiental da Agência Estadual de Recursos Hídricos (CPRH), que informou ainda não ter perspectiva para a liberação. Mas, no balanço do PAC, é mais um que consta com o carimbo verde, de “aprovado”.

Obras hídricas se destacam

No lado das realizações do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em Pernambuco, as obras hídricas são o destaque positivo. Grandes projetos estão finalmente saindo da mera intenção para a realidade, como o Sistema Adutor de Pirapama, de Agrestina e do Pajeú. Se a polêmica transposição do São Francisco patina, obras de menor porte estão avançando mais rápido, embora também não estejam prontas.

“De todos os projetos que nós tivemos recursos disponibilizados pelo PAC, que totalizam cerca de R$ 800 milhões, nós temos apenas R$ 12 milhões que estamos precisando destravar, emperrado com licenciamento ambiental e titularidade de imóveis”, comemora o secretário de Recursos Hídricos e presidente da Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa), João Bosco de Almeida. A estatal passou anos podendo fazer projetos, mas sem recursos para executá-los. Com o PAC e a solução de um entrave legal entre a Compesa e a Caixa Econômica Federal, que impedia o repasse de recursos para a companhia pernambucana, o Estado se habilitou a receber verbas para projetos que já tinha na gaveta e outros que foram elaborados depois.

O mais emblemático deles é o de Pirapama. A barragem estava pronta desde 1999, acumulando água, enquanto a Região Metropolitana do Recife já convivia com o racionamento. Faltavam recursos para a adutora: R$ 430 milhões. A ordem de serviço foi assinada em janeiro do ano passado e os serviços estão sendo feitos pelo consórcio Queiroz Galvão/OAS/Odebrecht.

No início do ano, a obra estava quatro meses atrasada em relação ao planejado, mas o consórcio responsável já aumentou o número de turmas responsável pela solda dos canos para cumprir o prazo prometido: junho de 2010. “A obra será entregue em junho, mas só em outubro ela estará operando. É que, neste tempo, estaremos fazendo os ajustes para colocar em funcionamento um sistema tão complexo”, argumenta o secretário. Quando entrar em operação, Pirapama injetará na RMR pouco mais de 5.000 litros por segundo, zerando o racionamento.

No interior, outras grandes adutoras estão também em obras. A construção do Sistema Adutor de Agrestina começou há pouco tempo e será entregue em 2010. A Adutora do Pajeú, executada pelo DNOCS, foi iniciada no mês passado.

Já em relação às obras da Funasa, João Bosco reconhece que algumas deixarão de ser feitas por falta de projetos. “Nós temos R$ 140 milhões dentro do PAC Funasa. Nós operacionalizamos R$ 70 milhões (do total). A dificuldade de elaborar projetos é grande por causa da pulverização dos recursos.

Estamos com uma proposta para redirecionar esses outros R$ 70 milhões”, afirmou. Fora isso, João Bosco acha que está tudo na mais perfeita ordem. Ele fala pela sua pasta. “O trabalho agora é tocar as obras. A execução de Pernambuco no PAC em saneamento está com luz verde na Casa Civil. Nós colocamos praticamente todas as obras na rua.”

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