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Leão dá prazo para o Senado explicar regalia

Receita cobra que a Casa esclareça em 20 dias por que não recolheu o Imposto de Renda relativo ao pagamento do 14ºe do 15º salários aos parlamentares. Por ano, cada senador deixou de repassar quase R$ 13 mil em tributos

JOÃO VALADARES

JÚNIA GAMA – CORREIO BRAZILIENSE

A Receita Federal fechou o cerco ao Senado. Na tarde de ontem, a Casa foi notificada e terá que apresentar, em até 20 dias, toda a documentação solicitada em relação ao pagamento de 14º e 15º salários sem descontar o Imposto de Renda. Os 81 senadores entraram na mira do Fisco após denúncia do Correio. Na quarta-feira, o mesmo procedimento foi realizado na Câmara Legislativa, que resolveu abolir os dois rendimentos adicionais após a repercussão do caso. Nos oito anos de mandato, o custo com o pagamento dos extras é de R$ 34,6 milhões. Cada senador deixa de pagar, por ano, R$ 12.948 de impostos.

Ontem, um dia depois de o senador Delcídio do Amaral (PT-MS) comunicar que o projeto da então senadora e atutal chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, que prevê o fim da farra com o dinheiro do contribuinte, será desengavetado, o assunto chegou à Mesa Diretora. O projeto, de acordo com o gabinete do senador Delcídio, vai à votação na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) em 20 de março.

A assessoria de imprensa do Senado comunicou que, até o início da noite de ontem, não havia sido informada sobre a notificação da Receita. No entendimento da Casa, a chamada "ajuda de custo" não pode ser considerada salário por ter caráter indenizatório. O que chama a atenção é que o próprio site do Senado Federal se refere às duas parcelas extras como 14º e 15º salários. Ontem, foi publicada uma matéria no portal do Senado cujo título era "CAS (sic) deve votar fim dos chamados 14º e 15º salários".

O cientista político Octaciano Nogueira explica que o "costume" de turbinar os vencimentos de parlamentares com pagamentos extras sempre ocorreu no Brasil, mas foi intensificado na década de 1960, quando a capital foi transferida do Rio de Janeiro para Brasília. "Até a década de 1950, eles recebiam 8 mil cruzeiros por mês, sendo que apenas 4 mil eram fixos e o restante era pago por sessão.

Quando vieram para Brasília, os benefícios a mais começaram a aumentar", diz.

O professor defende que, naquele momento, as "ajudas de custo" eram necessárias, já que os parlamentares dependiam delas para se estabelecerem na nova capital e não costumavam voltar todas as semanas a seus estados de origem devido à precariedade dos transportes. Hoje, o auxílio não teria mais sentido. "Eles vivem em Brasília, têm ajuda de custo para morar, apartamentos funcionais, passagens pagas para ir toda semana para seus estados. Isso é legislar em causa própria, é o que eles mais gostam de fazer", critica.

Ampla liberdade

Instituídos pela primeira vez na Constituição de 1946, os dois salários a mais foram mantidos no texto constitucional de 1967, que vigorou durante a ditadura militar. A Constituição de 1988, no entanto, eliminou qualquer menção à ajuda de custo, mas inseriu um dispositivo que dá aos parlamentares ampla liberdade para o Congresso Nacional fixar subsídios para deputados e senadores.

Com isso, a inserção de penduricalhos para rechear os bolsos das excelências fica a critério dos legisladores. Em 1995, um decreto promulgado pelo senador Humberto Lucena, então presidente da Casa, fixou o pagamento da "ajuda de custo", equivalente ao valor da remuneração, no início e no fim de cada sessão legislativa.

Lucena é um ícone do que o professor Octaciano destaca como legislador "em causa própria".

Além de ter ficado conhecido como um dos "anões do orçamento", grupo de congressistas envolvidos em fraudes com recursos do Orçamento da União nos anos 1990, o senador também protagonizou um escândalo em 1993, quando determinou que a gráfica do Senado imprimisse 130 mil calendários com sua foto e distribuísse o material na Paraíba. Considerado inelegível pelo Supremo Tribunal Federal (STF), Lucena logo foi anistiado pelo Congresso.

Atualmente, o 14º e o 15º salários são regularizados por um ato conjunto de 2003, assinado pelas Mesas Diretoras do Senado e da Câmara. Cláudio Abramo, diretor da ONG Transparência Brasil, afirma que, apesar de reprovável e imoral, o "caixa extra" dos parlamentares não é ilegal, já que os constituintes tiveram a preocupação de inserir na Carta Magna o artigo que lhes permite arbitrar, sem interferências, sobre quanto irão receber no exercício do mandato. "Há na Constituição a previsão de um teto para o salário, mas aí inventam coisas que não são contadas como salário, como esses subsídios", lamenta.

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