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Para Dib, ideal seria diminuir o número de vereadores


Guilherme Kolling

João Antônio Dib (PP) cumpre seu nono mandato consecutivo na Câmara Municipal de Porto Alegre. Aos 78 anos, o vereador mais experiente da Capital - ingressou no Legislativo em 1968 - observa o inchaço da casa parlamentar da Capital, que passou de 21 integrantes para 36 parlamentares. Enquanto a Câmara Federal aprova o aumento do número de vereadores em todo Brasil, Dib defende o enxugamento. "Antes, tínhamos uma Câmara com menos vereadores e funcionava muito melhor", entende.

Dib também teve experiência no Executivo. Foi nomeado prefeito de Porto Alegre há 25 anos e sustenta que a operação do município é mais eficiente com uma equipe enxuta. "Tinha poucos secretários e as coisas andavam muito mais rápido", lembra. Ele critica o crescimento no número de secretarias, autarquias municipais e cargos em comissão.

Nesta entrevista, concedida em seu gabinete, o vereador fala de eleições municipais, do mau funcionamento do Legislativo - que, na visão dele, produz leis inócuas ao invés de fiscalizar -, e da suspeita de envolvimento de integrantes de seu partido na fraude do Detran.

Jornal do Comércio - O senhor vai tentar o décimo mandato?

João Dib - Vou. Sinto a mesma disposição de trabalhar que sempre tive, só que agora tenho mais experiência. Enquanto eu entender que posso ser útil, eu quero ser útil. E sou muito crítico sobre mim mesmo. Quando estiver na hora, vou parar. Mas enquanto puder trabalhar como vereador, trocar idéias, receber e dar informações, vou continuar sendo.

JC - Qual sua avaliação sobre o tamanho dos legislativos?

Dib - Há um excesso de vereadores. Até 1982, a Câmara de Porto Alegre tinha 21 vereadores e funcionava muito melhor do que hoje com 36. A Assembléia Legislativa está certa aqui no Rio Grande do Sul, com 55 deputados - já tivemos 56. Agora, temos 513 deputados federais no Brasil. Os Estados Unidos, 436, e têm muito mais dinheiro do que nós; eles têm 100 milhões de habitantes a mais do que nós, 1 milhão de quilômetros quadrados a mais do que nós, 50 estados.

Se tivéssemos a mesma proporção, teríamos 234 deputados. Se fizéssemos a mesma coisa com o Senado, teríamos 54 senadores. Tem senador que passou a vida inteira no Maranhão, e é senador no Acre, o José Sarney (PMDB-AC). A filha é senadora no Maranhão. Isso é porque nosso sistema político é muito facilitado.

JC - O senhor defende uma reforma política?

Dib - Sim. Deveriam ter três ou quatro partidos. Os grandes países têm dois partidos: os Estados Unidos, Democratas e Republicanos; a Inglaterra, Trabalhistas e Conservadores. E funciona muito melhor do que nós. Temos tantos partidos que participam para buscar empregos, cargos, fazer negociações. Claro, há, por exemplo, um PCdoB, que tem uma história de 85 anos, então tem que respeitar. Não cresceu, mas tem história. Agora, outros partidos não têm oito anos. Com menos partidos fica mais fácil governar. Com muitos, tudo se torna muito complicado.

JC - E o tamanho do Executivo?

Dib - A prefeitura deve diminuir o número de secretarias. Assim o dirigente maior tem um controle melhor. Fui prefeito com 10 secretarias e três autarquias. A maioria dos secretários era de servidores municipais. Agora tem muito mais secretários, fica mais difícil reunir os pontos de vista. Imagina um governo com 38 ministros. Não é assim... É necessário simplificar para governar bem. Aí se pode controlar as pessoas, fazer as reuniões necessárias e trabalhar com muito mais efetividade. Em Porto Alegre, é natural que haja dificuldade de entendimento entre todos os secretários.

JC - E o formato defendido pelo prefeito Fogaça, de governar com muitos partidos. Também dificulta?

Dib - Para ele está difícil. E as idéias dos partidos são diferentes, as pessoas são diferentes, fica muito difícil controlar. Para solucionar um problema é preciso nomear uma comissão. Se a vontade é decidir, se nomeia uma comissão de 3, 4, 5 integrantes. Agora, se não há interesse, é nomeada uma comissão com 12, 20 integrantes. E ninguém pode dizer nada, está lá o grupo de trabalho. Mas é o que acontece. As comissões são semelhantes ao Senado, à Câmara Federal e às Câmaras de Vereadores. Em Porto Alegre não precisa nem 21 vereadores, na verdade. O Tribunal de Contas tem sete conselheiros e analisa as contas de 496 municípios, 496 Câmaras de Vereadores, a Assembléia Legislativa, todo o governo do Estado. E consegue fazer isso com sete servidores. Então, nós temos muitos legisladores e aí fica a preocupação de fazer leis e mais leis, que se sobrepõem.

JC - Isso continua acontecendo em Porto Alegre?

Dib - Continua. Pior é que perdem tempo discutindo as leis inócuas. Elas são as maiores inimigas das boas leis, que, de repente, não são discutidas, porque se perdeu muito tempo fazendo discussão. No ano passado, fizemos uma discussão de um projeto de lei que criava o dia do "Sim à vida e não à pena de morte". Achei uma barbaridade. A pena de morte é proibida pela Constituição. Mas houve 16 discursos e terminaram não votando. De que serviria se não temos pena de morte no Brasil?

JC - Foi uma discussão inútil...

Dib - Em 2002, do dia 29 de abril até 14 de maio só se discutiu o fechamento do comércio aos domingos, na Câmara. E já se sabia o resultado: não se permitira a abertura do comércio aos domingos, o prefeito sancionaria o projeto, os comerciantes entrariam na Justiça e derrubariam a lei. Em 2003, eu era presidente e eles apresentaram de novo o mesmo projeto. Chamei os comerciários: "Vocês sabem o resultado. Não precisa encher de gente a Câmara, porque vai ser aprovado. O prefeito vai sancionar, mas vão entrar na Justiça e vocês vão perder". Foi o que aconteceu. Só que o projeto foi aprovado em 45 minutos e não em 15 dias. E eles então pararam de fazer esse projeto. Mas, continuam fazendo leis que cabem ao prefeito, não ao vereador. Dia disso, dia daquilo... É uma coisa infernal.

JC - Isso explica a perda de espaço do Legislativo municipal no noticiário?

Dib - Sim. Mas o noticiário faz uma cobertura muito grande, por exemplo, quando o vereador Mário Fraga propõe rodízio de carro, par e ímpar. Se fosse aprovado, dificilmente eu sairia de casa para Caxias, por exemplo, se tivesse uma placa par e o dia fosse ímpar. Porque num raio de 15 quilômetros eu seria multado. O problema se resolve com um sistema viário, um planejamento que não temos. Não é fazendo essas coisas. Mas teve cobertura.

JC - E a revisão do Plano Diretor, termina esse ano?
Dib - Se o vereador Luiz Braz (PSDB) entregar o relatório até 30 de junho, vai dar, sem problema nenhum. Mesmo que não votem no período eleitoral, de outubro a dezembro nós trabalhamos. Tem que sair esse ano.

JC - Seria o sexto ano consecutivo de adiamento.

Dib - Exatamente, porque em um ano o Executivo retirou o projeto; em outro ano, o projeto não foi realizado; no outro ano só veio uma parte; depois retiraram... Não foi culpa do Legislativo, foi culpa do Executivo.

JC - Mas é um tema importante. O debate do sistema viário, por exemplo, está incluído.

Dib - Mas não tem definição, mapas, plantas. Eles falam, por exemplo, que já têm o Plano Diretor Cicloviário. Não entendo como temos um plano cicloviário se não temos um plano viário. As obras que os prefeitos fizeram estão previstas por Loureiro da Silva. Não foram projetadas, foram previstas. Mas estavam pensadas. Na projeção de Loureiro da Silva se diz onde teria que ser a rodoviária, onde termina o parque da Redenção, como levar o campus da Universidade para a Agronomia. Ele disse: "Tem que levar o Jóquei Clube para o Cristal e aqui no Jóquei deve ser feito um parque". Naprimeira perimetral, ele chega ao extremo de dizer que tem que ter um túnel ligando a rua da Conceição com a rua Sarmento Leite. A segunda perimetral está prevista. A terceira não, já foi previsão do primeiro Plano Diretor.

JC - Em 1959...

Dib - Em 1959, mas só entrou em vigor em 1961. Depois, em 1979, o Guilherme Socias Villela fez uma modificação, um novo Plano Diretor. Que, eu acho, era melhor que o atual, o de 1999.

JC - Por quê?

Dib - A população estava mais satisfeita. A insatisfação da população é muito grande em relação à descaracterização dos bairros. Acho difícil 36 vereadores querendo dar sua opinião em assuntos que, às vezes, não entendem quase nada. Mas, se fossem 11, eles entenderiam melhor. As Câmaras gastariam menos, o Senado e a Câmara Federal gastariam menos e o Brasil andaria melhor. Realmente é muita lei nesse País.

JC - Além do primeiro escalão, qual a diferença no tamanho da máquina na prefeitura, entre sua gestão e hoje?

Dib - Quando eu saí, a prefeitura tinha 17,5 mil servidores ativos e inativos. Agora tem 26 mil ou mais. É muito. A cidade não cresceu 40%. E não havia serviço terceirizado. Inclusive, quando eu fui prefeito, a Câmara fez uma lei proibindo a terceirização. Mas o Partido dos Trabalhadores fez a terceirização por muito tempo, contrariando a lei. Depois de 10 anos, fizeram um projeto de lei autorizando a terceirização do serviço. Mas já estavam todos terceirizados: Dmae, Smov... Além da quantidade de servidores, e cargos de comissão que foram criados.

JC - Como o senhor projeta a eleição, agora com a comparação entre duas experiências - a atual e a anterior?

Dib - Acho que vai dar mais ou menos a mesma coisa: vai dar Frente Popular e José Fogaça.

JC - O senhor fiscalizou as duas gestões. Quais as diferenças entre elas?

Dib - As duas têm pontos positivos e negativos. O Fogaça encontrou a prefeitura com déficit de R$ 175 milhões. Uma das ações que faço mensalmente é acompanhar a execução orçamentária. Até 30 de setembro de 2004, a prefeitura tinha em CDBs R$ 100 milhões. Quem tem dinheiro em CDB está com dinheiro sobrando. No mês de dezembro a arrecadação é o dobro de outros meses, e eles ficaram com R$175 milhões de dívidas de curto prazo. Quando o prefeito Fogaça assumiu, na primeira semana, pagou US$ 5 milhões ao BID, que deveriam ter sido pagos em 2003. Ele pagou em 2005, e ficou sem o crédito para empréstimo, porque a prefeitura teve déficit durante três anos consecutivos. E foi maquiado, não apareciam esses déficits.

JC - 2002,2003,2004...

Dib - O Fogaça conseguiu, depois de dois anos, recuperar. Mas no ano passado ia ser déficit, só foi superávit, só não aconteceu porque ele vendeu a folha de pagamento para a Caixa. Senão, teria dado déficit de R$ 30 e poucos milhões.

JC - Mas já teve época em que a prefeitura estava com dinheiro para fazer obras. Depois foi apertando...

Dib - A maioria dessas obras foi feita com financiamento. Depois tem que pagar. A prefeitura tem capacidade de endividamento, pode se endividar cinco vezes mais, mas tem que pagar.

JC - O senhor já pensou em se candidatar a prefeito?

Dib - Eu não tenho mais condições de me candidatar à prefeitura.

JC - Mas, o senhor chegou a pensar em retornar?
Dib - Em 1992 eu fui aclamado como candidato a prefeito, pelo meu partido, pelo PDS. Disseram que eu era seu candidato a prefeito. Mas concorreu o Villela.

JC - E o projeto Porto Alegre do futuro?

Dib - O objetivo do projeto é que Porto Alegre tenha um estudo. Que a cidade seja estudada para um futuro mais amplo, não para daqui cinco anos.

JC - O senhor acha que é o melhor momento para isso? Não poderia desviar o foco e prejudicar, por exemplo, o debate do Plano Diretor?

Dib - Não é nada disso. Não é a Câmara que está debatendo. Está sendo feito um seminário, que acontece lá na Pucrs. Então, é uma coisa que corre paralelamente ao Plano Diretor, sem qualquer interferência na Câmara.

JC - O senador Pedro Simon disse que quem está legislando no Brasil é o Executivo. O senhor concorda com essa avaliação?

Dib - Lá é o caso das chamadas MPs, as Medidas Provisórias. Aqui no município não tem isso. Aqui não tem decreto-lei.

JC - A CPI do Detran está ouvindo acusados pelo desvio de recursos. Há integrantes do PP com suspeita de envolvimento.

Dib - É uma situação desagradável...

JC - O senhor tem acompanhado os depoimentos?

Dib - Eu ouvi o depoimento do deputado José Otávio Germando. E acho que ele se saiu bem. Mas, acho que essa CPI é uma palhaçada, porque, primeiro, não condena ninguém. Segundo, porque o normal é uma CPI encaminhar a denúncia ao Ministério Público. Mas nesse caso é o inverso. Eles estão usando o material do Ministério Público para fazer um questionamento. Quer dizer... Outro dia eu estava assistindo a uma sessão, sou telespectador do canal 16 da Net, que passa a programação dos legislativos. E estava vendo a deputada Stela Farias (PT) questionando o Lair Ferst. Ela fala, fala, pergunta mas não pergunta... Mas ela não pode fazer um trabalho melhor do que a Polícia Federal. A Assembléia não tem essa condição. Eu acho que a CPI deve existir, mas não para esse tipo de situação, em que não está preparada para fazer o trabalho.

JC - O senhor acha que é só para ganhar espaço na imprensa.

Dib - É. Porque não vai acrescentar nada para o Ministério Público.

JC - E a tese de que pelo fato de a CPI divulgar que houve essa corrupção contribui para a sociedade?

Dib - Não discordo. Mas a notícia foi divulgada em todas as instâncias. Era só manter a notícia.

JC - O senhor acha que a mídia está dando muito espaço para a cobertura desta CPI?

Dib - Acho que está dando muito espaço. É difícil dizer que a mídia esteja equivocada. Equivocados estão os deputados, é uma maneira de eles aparecerem. Há assuntos que precisam de CPI sim. Agora é um trabalho de policial. Não tem outro jeito. Em Brasília, quem descobriu o banco de dados da ministra Dilma Russeff? Foi a Polícia Federal, não a CPI dos Cartões.

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