No Maranhão, a Governadora Roseana Sarney cedeu à pressão popular e extinguiu conselhos que custavam R$ 14,5 milhões aos cofres
Por Carla JIMENEZ - IstoÉ Dinheiro
O presidente da Câmara dos Deputados, Henrique Alves (PMDB-RN), não integra nenhum reality show. Mas o deputado potiguar nunca se sentiu tão vigiado como nas últimas semanas. Depois de ter admitido o uso de um jatinho da Força Aérea Brasileira para assistir à final entre Brasil e Espanha, na Copa das Confederações, no Rio de Janeiro, na companhia de amigos e familiares, Alves teve de voltar atrás, na semana passada, em uma licitação aberta para alugar dois carros utilitários que ficariam à sua disposição quando visitasse sua base eleitoral. Tudo ao custo de R$ 222 mil, pagos com os recursos do contribuinte.
Embora o Congresso tenha justificado o pedido porque, em tese, seria mais barato alugar do que comprar um carro novo, a repercussão negativa da notícia, veiculada pelo jornal Folha de S. Paulo, fez Alves recuar. Em maio, o presidente do Senado, Renan Calheiros, também justificou como medida econômica o aluguel de três carros importados, por R$ 5.630 mensais cada um, o que foi questionado, na época, por especialistas no setor automobilístico. O custo da locação, em 22 meses, pagaria um veículo novo. Três meses atrás, no entanto, os brasileiros não demonstravam a tolerância zero atual com os abusos do poder público.
Depois da onda de protestos que sacudiu o País no mês passado, a prestação de contas sobre a utilização do dinheiro público começa a ser mais cobrada pelos cidadãos. A governadora do Maranhão, Roseana Sarney, que o diga. A filha do presidente do Senado, José Sarney, teve de reconhecer o poder da gritaria, depois que manifestantes se alternaram em frente à sua residência no bairro do Calhau, em São Luís, na esteira dos protestos que varreram o País no mês de junho. O movimento batizado "Acorda Maranhão" exigia o fim de três conselhos do Estado, que reuniam mensalmente 206 pessoas, entre correligionários e familiares da governadora, para debater políticas públicas.
Em troca, cada conselheiro recebia um bônus de R$ 5.850 mensais, um custo de R$ 14,5 milhões anuais para os cofres do Estado. A pressão funcionou e no último dia 5 o governo maranhense anunciou a extinção dessas instâncias, justificando que a iniciativa vai ao encontro "de uma nova realidade que o Brasil experimenta". Em diversas cidades do País a pressão popular vinha contabilizando conquistas sociais importantes, mesmo antes dos protestos de junho. Em 2010, por exemplo, um grupo de estudantes de Brasília se uniu para fiscalizar a ação dos deputados distritais. Uma das primeiras ações foi questionar o 14° e o 15° salário da Câmara local, por meio da campanha "Mais de 13, não".
Depois de criar o site Adote um Distrital, os jovens transportaram as reivindicações para o ambiente virtual e para as ruas. Em pouco tempo, ganharam apoio da população local e garantiram o fim do privilégio e uma economia de R$ 1 milhão anuais para a capital do País. "Outras cidades adotaram a mesma campanha e o assunto chegou ao Congresso, que cancelou os salários extras dos deputados e senadores no início deste ano", diz o economista Leonardo Oliveira, um dos idealizadores do site Adote um Distrital, que criou também o sistema De Olho nas Emendas Parlamentares (One), para submeter a um pente-fino os pedidos de recursos extras dos deputados.
Oliveira também é voluntário no Instituto de Fiscalização e Controle (IFC), uma entidade constituída em 2005 por profissionais da área, que trabalham para o setor público–entre eles há auditores federais, além de voluntários da Controladoria Geral da União e do Tribunal de Contas da União, por exemplo. Essa turma participa de ações itinerantes em municípios interioranos, cujo objetivo é fornecer noções básicas de fiscalização dos recursos públicos aos moradores locais. "Há mais de 300 organizações de controle social no País, de olho na prestação de contas de recursos públicos", diz Jovita José Rosa, presidente do IFC.
Numa das caravanas realizadas em abril deste ano, em Minas Gerais, uma equipe do IFC visitou postos de saúde e descobriu que em diversas regiões os médicos e dentistas neles lotados recebiam salários sem trabalhar. "No município de Januária, por exemplo, os dentistas alegaram que não iam trabalhar porque não havia material, mas na verdade tudo estava encaixotado", afirma Jovita. Em São João Del Rei, a caravana do IFC também encontrou médicos que recebiam sem atender a população.
"Conseguimos firmar um Termo de Aditamento de Contrato, com apoio do Ministério Público local, para que eles se comprometessem a comparecer, pelo menos duas horas por dia, ao trabalho."
Procuradores de Ministérios Públicos estaduais têm liderado ações importantes com vistas a eliminar benefícios abusivos de políticos. Em São Paulo, o promotor Saad Mazloum impetrou uma ação contra o auxílio-moradia, um bônus de R$ 2.250 mensais, pago aos 94 deputados estaduais, inclusive para os residentes na capital. "Havia deputados que moravam ao lado da Assembleia Legislativa", diz Mazloum, que seis meses antes havia entrado com ação para eliminar outra distorção: o auxílio-paletó, uma verba para compra de roupas no valor de R$ 21,8 mil, recebida duas vezes por ano.
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