Luiz Eduardo Rocha Paiva
General da reserva
O Brasil desponta como potência no cenário mundial, com possibilidade de evoluir de ator apenas retórico para participante influente. Tal ascensão leva o país a enfrentar conflitos na disputa ou defesa de interesses vitais ao nosso futuro. Entre esses, destacam-se a exploração e o controle soberano de nossos recursos, na Amazônia e no Atlântico Sul, e a liderança do processo de integração da América do Sul, duas condições importantes para ter o respeito internacional e, em conseqüência, impor-se no mundo globalizado.
As potências que conduzem os destinos do mundo — EUA, Grã-Bretanha, França, Alemanha, Rússia, Japão e China — demonstram ser fundamental desenvolver equilibradamente os campos do poder nacional — político, econômico, psicossocial, militar e científico-tecnológico —, o que não acontece no Brasil, haja vista a sua debilidade militar e científico-tecnológica.
Aquelas potências empregam diretamente o poder militar quando estão em jogo interesses vitais e têm liberdade de ação para fazê-lo, seja pela fraqueza militar do oponente, seja pela impossibilidade ou desinteresse de aliados deste último em prestar-lhe apoio militar direto. Aí estão os exemplos dos conflitos no Iraque, no Kosovo e na Geórgia. Elas — as potências — prestigiam o assessoramento militar ao núcleo decisório do Estado para a tomada de decisões que afetem a segurança nacional. O Brasil, ao contrário, praticamente alijou a liderança militar da assessoria direta ao chefe de Estado, inclusive no trato de assuntos dessa natureza.
Está para ser lançado o Plano Estratégico de Defesa formulado por um comitê presidido pelo ministro da Defesa e coordenado pelo ministro extraordinário de Assuntos Estratégicos. Espera-se que tenham sido ouvidos setores civis da sociedade que estudam o tema e que os estados-maiores da Marinha, Exército e Aeronáutica tenham participado de maneira efetiva e não apenas sido consultados sobre ações previamente definidas em foros restritos. Espera-se, também, que o plano assegure o aporte anual de recursos orçamentários fixos, para investir no fortalecimento progressivo do poder militar e na redução do desnível científico-tecnológico. Espera-se, ainda, que não seja mais uma iniciativa para inglês ver, como outras de sucessivos governos nos últimos anos.
O plano preconiza parcerias com potências e com países vizinhos no desenvolvimento tecnológico e na produção de material de emprego militar. É uma decisão válida no momento, mas não deve impedir que, a médio e longo prazo, se alcance a maior autonomia possível nas áreas de pesquisa, desenvolvimento e produção de material bélico. O Brasil não pode calcar sua defesa em parcerias com outras potências ou aliados, pois perderá liberdade de ação e comprometerá sua segurança em conflitos com terceiros, caso envolvam interesses daqueles parceiros.
Por outro lado, não basta um forte poder militar, mesmo que confira visível capacidade de dissuasão. Isso agrega valor à defesa nacional, que se subordina à segurança nacional, esta, sim, um status finalístico e muito mais abrangente, que resulta do fortalecimento equilibrado de todos os campos do poder, da coesão nacional e do respeito internacional. Portanto, depende muito mais do campo político do que do militar.
O Estado brasileiro submete-se a pressões internacionais e, na Amazônia e na questão indígena, adota políticas que comprometem a soberania e a integridade territorial, portanto a segurança nacional, tornando inócuo qualquer aparato de defesa. Embora o quadro possa reverter, temos hoje soberania limitada, de fato, sobre partes da região, estando em vias de perdermos a integridade territorial sem que os atores adversos tenham que empregar o poder militar. Sun Tzu disse: “Lutar e ganhar todas as batalhas não é a suprema glória, a glória suprema é quebrar o inimigo sem lutar”. Eis a estratégia indireta (“arte do desvio”) usada há duas décadas por EUA, Grã-Bretanha, França e outras potências.
A perda da plena soberania na Amazônia enfraquece o Brasil em todos os campos do poder, impede a condução do processo de integração sul-americana e leva à perda do respeito internacional, pois o mundo não perdoa nações e povos que demonstrem ser moral e politicamente fracos. Se assim for, ao Brasil restarão os papéis de um cobiçado mercado a ser explorado e controlado e de um interlocutor “aplaudido” em foros internacionais pela retórica idealista, porém ingênua.
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