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Corregedor investigado por improbidade

Ministério Público apura suposta conduta corporativista do chefe do órgão responsável por punir as irregularidades cometidas por servidores do Itamaraty

JOÃO VALADARES - CORREIO BRAZILIENSE


O Ministério Público Federal (MPF) investiga a conduta do corregedor do Ministério das Relações Exteriores (MRE), Heraldo Póvoas de Arruda, por suposta improbidade administrativa em relação aos procedimentos instalados na repartição sob sua responsabilidade. O inquérito civil público, instaurado em 3 de junho de 2013, é baseado em denúncias publicadas no Correio em abril (veja memória). Há casos de desvio de dinheiro público, contas que não fecham, homofobia, assédio sexual, sumiço de obras de arte e até de utilização do prédio de uma embaixada para casamento de amigos.

Os resultados são quase sempre nulos. A corregedoria é apática diante dos malfeitos. O corporativismo é tão evidente que, nos últimos 10 anos pelo menos, de acordo com o Portal da Transparência, apenas um servidor acabou desligado do MRE. Há casos graves em que nem sequer o procedimento correicional é aberto.

Em ofício encaminhado ao embaixador Póvoas, o procurador da República Igor Nery Figueiredo pede que o Itamaraty informe “a quantidade de procedimentos sob sua condução, com extrato resumido de seu objetivo e fase procedimental, o organograma e a estrutura do órgão e cópia em mídia do inteiro teor dos procedimentos que apuraram os fatos mencionados nas reportagens”.

O documento, encaminhado em 17 de junho ao Itamaraty, estipula prazo de 20 dias para o MRE se posicionar. Até agora, nenhuma resposta foi encaminhada ao Ministério Público Federal. A assessoria de imprensa da pasta comunicou que as informações estão sendo coletadas e que vai, em breve, encaminhar ao órgão todos os dados requisitados. O MPF confirmou apenas que o procedimento está em curso e que aguarda o envio dos dados.

O embaixador Heraldo Póvoas de Arruda é chefe da corregedoria desde 2005. A estrutura comandada por ele parece moldada para não funcionar. Conta com apenas dois oficiais e um assistente de chancelaria. Em 2008, uma funcionária que trabalhava na Embaixada do Brasil em Berlim foi pega desviando cerca de 10 mil euros da renda do setor consular. Ao ser questionado sobre o resultado oficial da apuração, quando a reportagem foi publicada, em abril, o MRE informou que “o assunto não teve desdobramentos correicionais”.

Intervenção branca

Três anos depois, o Itamaraty decidiu realizar uma “intervenção branca” na embaixada em Harare, capital do Zimbábue. O Escritório Financeiro do Ministério em Nova York apurava para onde tinham ido cerca de US$ 300 mil destinados a manter a embaixada. Já tinha identificado uma série de irregularidades na prestação de contas, como pagamento a funcionários locais demitidos havia anos e recolhimento de benefícios previdenciários a servidores inexistentes. Apesar da gravidade do caso, os funcionários, segundo o MRE, sofreram apenas uma suspensão.

No ano passado, denúncias levaram à identificação de um esquema de desvio de renda consular arrecadada pelo consulado-geral do Brasil em Washington. A irregularidade era comandada diretamente por servidores da repartição consular. Mais uma vez, os envolvidos receberam apenas uma suspensão após restituírem o valor dos débitos identificados.

Se a corregedoria fosse ativa, vários casos graves poderiam ter sido evitados. Em 2007, quando era cônsul-geral em Toronto, no Canadá, Américo Dyott Fontelle foi acusado de assédio moral. Nada ocorreu. Apenas algumas recomendações óbvias, a exemplo de que o diplomata “tivesse maior cuidado na gestão das relações humanas, evitando condutas que pudessem ser interpretadas como ofensivas”.

Neste ano, o mesmo diplomata, quando estava à frente do consulado-geral em Sydney, na Austrália, foi acusado de assédio moral e sexual, homofobia e abuso de poder contra oito contratados locais e servidores públicos do posto.

Em 2010, o chefe da Embaixada do Brasil em Roma, José Viegas, promoveu um casamento de amigos e uma recepção para convidados no Palácio Pamphilj, sede da representação diplomática. Nada ocorreu. O diplomata garantiu que pagou as despesas do próprio bolso, no entanto, usou a estrutura do prédio público, custeado com dinheiro do contribuinte. Mais uma vez, nenhum procedimento disciplinar.

Segundo resposta do Itamaraty, “não há impeditivos para realização de eventos de cunho privado no palácio”.

US$ 300 mil

Valor que desapareceu em 2012 e seria destinado a manter a embaixada em Harare, capital do Zimbábue

Memória

Diplomatas fantasmas


Em abril, o Correio denunciou a existência de pelo menos 18 diplomatas fantasmas, que ganhavam em média R$ 20 mil de salário, na estrutura do Ministério das Relações Exteriores (MRE). 


Durante mais de uma década, ninguém nunca foi punido. Só depois da publicação, algumas medidas foram tomadas. Em maio, o Itamaraty começou a lotar os servidores que não davam expediente. Em 10 dias, cinco conselheiros e dois ministros de 2ª classe foram lotados. Além deles, dois embaixadores que figuravam na lista pediram para se aposentar. No entanto, da relação publicada, ainda há sete pessoas sem local de trabalho.

Um dos casos que chama a atenção é o de Ilka Maria Lehmhul Trindade Cruz. Em 22 de maio, o MRE publicou a aposentadoria da conselheira. Desde 2006, ela simplesmente desapareceu do controle interno da pasta. O Itamaraty não sabia sequer do paradeiro da diplomata. Ela passou pouco mais de seis anos sem trabalhar, mas continuou recebendo todo mês R$ 19.297. Mesmo assim, na época, nenhum procedimento de investigação do caso foi aberto para punir a servidora.

Outro caso curioso era o do embaixador Mario Grieco. Ele recebia salário de R$ 20.729,81, mas não trabalhava desde 2006. Só em julho do ano passado, o MRE descobriu o caso e, no mês seguinte, fez um memorando sugerindo uma lotação. No entanto, segundo o Itamaraty, ainda não havia definição do local para o qual ele seria remanejado. No fim de maio, foi publicada a aposentadoria do embaixador.


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