Juliana Castro - O Globo
Pressionadas pelas manifestações que acontecem desde junho, Assembleias Legislativas de vários estados passaram a trabalhar pelo fim do voto secreto, principalmente nos casos de cassação de mandato dos deputados. No Amazonas e em Minas Gerais, as mudanças ocorreram em julho, depois dos atos nas ruas e de dois anos de tramitação. As Casas seguiram, assim, posicionamento já adotado, mesmo antes dos protestos, por São Paulo, Distrito Federal, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Maranhão e Acre. Em outras unidades da Federação, como Rio e Santa Catarina, votações deste tipo ainda são secretas, mas, após os protestos, projetos foram apresentados para que o processo deixe de ser sigiloso.
Em São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Distrito Federal, Amazonas, Maranhão e Acre, toda e qualquer votação é aberta. Já no Mato Grosso do Sul, o nome dos deputados que se posicionam contra ou a favor à cassação do mandato de um de seus pares é conhecido, mas o processo ainda é secreto em casos de indicação de conselheiro para o Tribunal de Contas ou para ocupar cargo em órgãos estaduais e na concessão de título honorífico. No Rio Grande do Sul, o voto é aberto quando se decide se vai ou não retirar o mandato de deputado, mas nem Constituição Estadual ou o Regimento Interno tratam de como é o processo em caso de derrubada de veto do governador ou indicações para o Tribunal de Contas.
No congresso, propostas em análise
Atualmente, tramitam no Congresso dois projetos que preveem o fim do voto secreto em todas as votações da Câmara e do Senado. Há uma outra proposta que se refere ao fim do voto sigiloso apenas em casos de perda de mandato parlamentar por falta de decoro e de condenação criminal. É para este último projeto que faltam menos votações para a aprovação: quatro. Para manter a agenda positiva imposta depois da série de atos, a expectativa é que o fim do voto secreto no Congresso seja apreciado neste início dos trabalhos após o recesso parlamentar.
No total, 17 estados seguem os passos da Câmara e do Senado de manter secreta a votação sobre cassação de mandato. Oito deles informaram, ou em seus sites ou diretamente ao GLOBO, ter projetos em tramitação para acabar com o sigilo. Nesta situação estão, além de Rio e Santa Catarina, Ceará, Goiás, Mato Grosso, Pará, Tocantins e Paraíba.
O restante não confirmou se havia propostas para impor o fim do voto secreto. Na maioria dos casos, o projeto em tramitação aguarda análise das comissões de Constituição de Justiça das Casas e prevê o fim de toda e qualquer votação secreta. A Assembleia do Piauí não repassou informações e não tem o regimento disponível na internet.
- Todo o indicativo é que, se o Congresso abrir o voto, vai ser uma pressão muito grande sobre as Assembleias - ressalta Ivo Coser, cientista político e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Um dos projetos que tramitam no Congresso Nacional se arrasta desde 2001. Reflexo do que ocorre em nível nacional, as Assembleias não deixam por menos e guardam propostas que percorrem o caminho em ritmo lento. É o caso, por exemplo, do Pará. No estado, o projeto que eliminaria o voto secreto em vários casos, incluindo o de cassação de mandato, foi apresentado em 2006. O projeto chegou a receber parecer favorável na Comissão de Constituição e Justiça, mas ainda aguarda votação em plenário.
Princípio da simetria alegado
Alguns estados que ainda têm voto secreto alegaram o princípio da simetria constitucional para explicar por que não mudam as regras. Segundo este princípio, estados obedecem ao mesmo modelo constitucional adotado pela União. A Constituição Federal prevê a votação fechada para a cassação de mandato, eleição de conselheiro do Tribunal de Contas, e escolha de procurador-geral. São essas regras que podem ser mudadas com a aprovação do projeto que tramita no Congresso.
- As Assembleias não querem arcar com o ônus político de ter uma votação fechada e estão jogando a culpa para esse argumento jurídico. O argumento existe, mas não acho que é aplicável. Acho que as Casas estão fazendo opções políticas - afirmou Ana Paula de Barcellos, professora de Direito Constitucional da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), para quem, se o Congresso aprovar o fim do voto secreto, as Assembleias vão perder o argumento:
- A regra geral é a da publicidade, prevista na Constituição, que é para todos os Poderes. Só se admitia essa exceção porque a Constituição as prevê. Então, se essas exceções deixam de existir...
Alerj aprovou voto aberto em 2001
A Assembleia Legislativa do Paraná, uma das que usaram esse argumento, afirma que já foi feita uma proposta de mudança constitucional e, em seguida, houve processo de votação para cargo de conselheiro do Tribunal de Contas, de forma aberta, em 2008. O processo acabou sendo questionado na Justiça, com o argumento de que o processo feriu princípios da Constituição. Segundo a Assembleia, o conselheiro eleito perdeu o cargo, justamente pela forma de votação aberta, quando a Constituição prevê votação secreta.
No Rio, a Alerj aprovou, em 2001, emenda constitucional garantindo o voto aberto no processo de cassação de mandato. Em função dessa mudança, cassou com voto aberto o mandato do deputado Marcos Abrahão dois anos depois, em junho de 2003. No entanto, decisão do Supremo Tribunal Federal, a partir de Ação Direta de Inconstitucionalidade, obrigou a Alerj a reempossar Abrahão. No Rio, apenas este tipo de votação permanece secreta.
Alguns parlamentares afirmam que abrir o voto nos processos de cassação é menos incômodo do que torná-los públicos nos casos de vetos dos governadores e na eleição da Mesa Diretora. Segundo eles, o voto aberto nessas duas situações vai facilitar retaliação por parte dos governadores, que passarão a ter controle sobre as possíveis traições.
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