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Em 9 dias, Delúbio arrecada mais dinheiro que ONGs

Campanha do PT para petista pagar multa supera doações à Pastoral da Criança e o Greenpeace em 2013


Bruno Goes, Marcelle Ribeiro, Tatiana Farah, André de Souza e Flávia Pierry | O Globo

RIO, SÃO PAULO, BRASÍLIA, TERESINA e PORTO ALEGRE — Para ajudar o mensaleiro Delúbio Soares, ex-tesoureiro do partido, a pagar a multa aplicada pelo Supremo, o PT organizou uma grande mobilização nacional e arrecadou, em curtíssimo espaço de tempo, mais dinheiro do que importantes ONGs, como a Pastoral da Criança e o Greenpeace. Em apenas nove dias, Delúbio recebeu R$ 1,013 milhão em doações (R$ 112,6 mil por dia). O Greenpeace Brasil, por exemplo, arrecadou, durante todo o ano de 2012, R$ 8,8 milhões (ou R$ 24 mil por dia), menos de um quarto da média diária atingida pelos petistas.

A Pastoral da Criança, organismo de ação social da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), fundada pela médica sanitarista e pediatra Zilda Arns, recebeu, entre outubro de 2012 e setembro de 2013, R$ 877.579 em doações individuais, captadas pelas Associações de Amigos da Pastoral da Criança. Menos, portanto, do que Delúbio e seus companheiros juntaram em nove dias. A conta não inclui as doações de empresas.

Para isso, integrantes da Direção Nacional do PT e dos diretórios nos estados mandaram milhares de e-mails para militantes cobrando ajuda para o companheiro, além de falar com sindicalistas e outras pessoas ligadas ao partido.

Segundo o coordenador do setorial jurídico do PT, Marco Aurélio de Carvalho, na noite de quarta-feira a conta-corrente criada para receber doações tinha cerca de R$ 440 mil, menos que o necessário para quitar o débito judicial de Delúbio, de R$ 466.888,90. Foi aí que a mobilização aumentou, os e-mails foram disparados, e o partido conseguiu uma virada no montante arrecadado, com a doação de cerca de 2 mil pessoas. Na quinta-feira, menos de 24 horas depois, mais R$ 573 mil tinham pingado na conta. Nesta sexta-feira, Delúbio pagou a multa.

O PT e a advogada Maria Leonor Poço Jakobsen, responsável pela coordenação da campanha de arrecadação para Delúbio, dizem que as doações foram todas de pessoas físicas, de valores entre R$ 10 e R$ 30 mil — esta feita pela família do também mensaleiro José Genoino, que repassou uma parte da sobra de arrecadação das doações feitas para o ex-presidente do PT.

— Houve depósito de R$10, de R$ 5 mil... O extrato da conta tem cerca de 60 páginas tamanho A4 — disse Maria Leonor, afirmando que doações de pessoas jurídicas não foram aceitas pelos organizadores da campanha. Os sindicatos também não doaram dinheiro para o mensaleiro.

Delúbio arrecadou, em nove dias, 10,2% do que o próprio PT recebeu em 2012 de seus filiados: R$ 9,95 milhões ao longo de 12 meses (R$ 27.177,05 por dia). Nesse ritmo, o próprio PT leva 37 dias, sete horas, nove minutos e 32 segundos para arrecadar com seus filiados o que Delúbio conseguiu em apenas nove dias. Em 2012, a maior parte das contribuições foi de parlamentares e ocupantes de cargos de primeiro escalão: R$ 7,8 milhões. Os filiados que ocupam cargos de confiança no governo repassaram R$ 2,1 milhões. Os dirigentes do partido, R$ 26.200. Os demais filiados deram apenas R$ 20.600.

Cartas de dirigentes do PT, como o presidente do partido em São Paulo, Emídio Souza, e o presidente nacional, Rui Falcão, estavam publicadas no site do partido pedindo apoio a Delúbio. Nesta sexta-feira, mesmo após a conta ter sido encerrada, ainda havia pessoas tentando fazer depósitos, que foram recusados pelo banco. Carvalho disse que não se surpreendeu com o valor arrecadado.

— Nós estamos muito satisfeitos, porque a nossa militância é uma militância muito aguerrida e realmente mostrou que sabe fazer a diferença. Solidariedade e companheirismo são os dois grandes valores que nortearam todo esse processo — disse Carvalho, coordenador do setorial jurídico do PT.

Apesar da grande mobilização petista, o comando da campanha de doações coube a uma filiada ao PCdoB. A advogada Maria Leonor disse que é amiga do ex-tesoureiro petista e que o conhece, politicamente, da militância sindical. Ela atua como defensora dos bancários, embora o Sindicato dos Bancários de São Paulo afirme não tê-la em seu quadro de funcionários. Faz parte também do conselho de administração do Instituto Nacional de Pesquisa e Defesa do Meio Ambiente (INMA), uma ONG comandada pelo ex-deputado goiano Aldo Arantes, do PCdoB, com sede em Brasília. Ela disse que fez a campanha porque o julgamento no STF violou vários princípios do Direito:

— Agora, o que sobrou vamos doar para os outros companheiros.

Assim, após o pagamento de impostos, os recursos excedentes irão para o ex-ministro José Dirceu, condenado a pagar uma multa de R$ 676 mil (em valores da época, que ainda serão corrigidos pela Justiça) pelo crime de corrupção ativa. O que sobrar irá para o deputado e ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP), multado em R$ 370 mil (também em valores da época) por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e peculato. Ele ainda tem um recurso a ser analisado e que pode levar à absolvição pelo crime de lavagem. Nesse caso, a multa seria reduzida para R$ 250 mil.

A mobilização pelos mensaleiros petistas continua. Numa lojinha dentro do diretório do PT do Rio, camisetas com as fotos de José Dirceu, José Genoino e Delúbio Soares com os punhos erguidos são vendidas a R$ 20 cada uma. “Não aceitamos a humilhação, preferimos a dignidade e a luta”, diz a inscrição abaixo da fotografia. Segundo a assessoria do PT, a vestimenta “é uma produção independente de um grupo de militantes, que pediu para deixá-las na lojinha do partido”. A renda arrecadada, segundo o partido, não será revertida para os condenados pagarem as multas.

“A legislação partidária proíbe que partidos políticos utilizem seus recursos para questões particulares”, diz a assessoria do PT-RJ.

No Piauí, a presidente regional do PT, Regina Sousa, confirmou que a campanha de arrecadação foi orientada pela assessoria jurídica do PT nacional através de e-mails e das redes sociais:

— Ninguém nos estados ficou responsável, todo mundo divulgou e pediu contribuições. Todo mundo fez a campanha divulgando nos meios e nas mídias sociais, ligando para os outros. Ninguém sabe quanto foi arrecadado em cada estado.

Segundo ela, os doadores foram orientados a se identificar, respeitando a legislação que exige declaração das doações no Imposto de Renda:

— O depósito é identificado, tem que botar o CPF e o número da conta. Foi um coisa bem organizada, a gente fez um apelo aos filiados, aos simpatizantes, e as pessoas responderam. 

(Colaboraram Efrém Ribeiro e Flávio Ilha)

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