Estudo considera período de 2008 a 2012. No topo do ranking está o prefeito de Sumidoro, cujo patrimônio cresceu 2.473,9%
Elenilce Bottari, Selma Schmidt e Sérgio Ramalho | O Globo
RIO — A construção parcialmente erguida à frente da Praça Getúlio Vargas, em Sumidouro, lembra um quiosque de lanches. Dividida em dois pequenos cômodos, ainda sem telhado e com parte dos tijolos à mostra, a estrutura está destinada a sediar a única rodoviária do município, na Região Serrana. Orçada inicialmente em R$ 150 mil, a obra, que deveria ter ficado pronta em 2014, se arrasta há quase quatro anos e teve o custo elevado em 50%, passando para R$ 225 mil. Enquanto o município vai mal, a vida do prefeito melhorou. Com 14,9 mil habitantes, a cidade é administrada por Juarez Gonçalves Corguinha (PMDB), um dos 20 prefeitos fluminenses que, entre 2008 e 2012, tiveram crescimento patrimonial acima da valorização do grama do ouro no período (122%). O levantamento só considerou os bens de 56 dos 65 prefeitos do estado que estão sob investigação ou sendo processados, conforme revelou ontem a primeira reportagem da série “O que eles fazem com seu voto”. Como nove não foram candidatos em 2008, não há declarações de bens desse ano disponíveis para uma análise da evolução do patrimônio.
Considerando-se que o IPCA, medido pelo IBGE, teve alta de 31,88% no mesmo período, o número de prefeitos que registraram aumento patrimonial acima da inflação fica ainda maior: 34. Só para efeito de comparação, o índice Bovespa, da Bolsa de Valores, entre 2008 e 2012 foi negativo: - 4,6%.
O prefeito de Sumidouro está no topo do ranking, com evolução patrimonial de 2.473,9%, segundo dados informados ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O valor dos seus bens passou de R$ 12.855 para R$ 330.889 de 2008 a 2012.
Já Miguel Alves Jeovani (PR), de Araruama, informou ter bens no valor de R$ 11,913 milhões. Um patrimônio 318% superior ao declarado no pleito de 2008: R$ 2,849 milhões. Ele não foi eleito em 2008, apenas em 2010, como deputado estadual. Na ocasião, declarou R$ 4,810 milhões em bens.
Já o prefeito de Carapebus, Amaro Fernandes (PRB), registrou em quatro anos um aumento patrimonial de R$ 61.400 para R$ 817.400. Um salto de 1.231%.
Juarez, de Sumidouro, tem uma explicação para a melhoria de sua situação. Diz que os R$ 13 mil que passou a receber em 2009, quando assumiu pela segunda vez a prefeitura — a gestão anterior foi de 2000 a 2004 —, lhe permitiram adquirir bens:
— Sou agente administrativo do INSS. Entre 2005 e 2008, vivi com o meu salário de R$ 2 mil.
Se as finanças pessoais do prefeito de Sumidouro vão bem, a situação da cidade segue caminho diferente. É o que estima o próprio administrador, que calcula em 10% a perda de receita este ano. Com isso, a ordem é apertar os cintos:
— Assinei decreto proibindo a prefeitura de fazer festas. Costumamos fazer principalmente exposições agropecuárias. Esperamos economizar R$ 2 milhões este ano.
Sobre as obras da rodoviária e os dois inquéritos em que é investigado no Ministério Público Federal, por crime de responsabilidade e contra a Lei de Licitações, Juarez não fez comentários.
Em Araruama, na entrada da cidade, uma placa com o nome do município está quebrada e pichada. Mais da metade das vias secundárias não tem calçamento, e a limpeza é deficiente. Quando disputou a eleição em 2008, Jeovani declarou 46 bens, incluindo nove casas e apartamentos. Em 2012, já listou 61. Por e-mail, a assessoria do prefeito disse que todos os seus bens “são declarados à Receita Federal. E sua renda vem de sua empresa de 25 anos, hoje administrada por sua família”. Ele é dono da rede de supermercados Só Ofertas.
Jeovani é alvo de quatro ações de improbidade no MP estadual. Em janeiro de 2014, foi afastado do cargo, mas retornou em julho, com liminar do STF. Ele é suspeito de irregularidades em licitação para a compra de merenda escolar.
Também na Região dos Lagos, a prefeita reeleita Franciane Conceição Gago Motta (PMDB), de Saquarema, teve uma evolução patrimonial de 360% em quatro anos. A mulher do secretário estadual de Governo, Paulo Melo, que afirmou ter bens no valor de R$ 103,8 mil em 2008, passou a declarar R$ 478,1 mil em 2012.
— Sou econômica e faço bons investimentos. A economia que faço na prefeitura faço em casa — argumenta Franciane, acrescentando que os bens foram declarados no Imposto de Renda.
EM RIO BONITO, SÓ UM SINAL DE TRÂNSITO
Na Baixada, o prefeito reeleito de Queimados também teve evolução patrimonial. Max Lemos (PMDB) saiu de R$ 250,339 mil em bens em 2008 para R$ 1,112 milhão em 2012 (344%). Por nota, a assessoria do prefeito alega que o resultado “é totalmente compatível com a renda da família”.
Em Japeri, cidade com o pior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do estado, o prefeito Ivaldo Barbosa dos Santos, o Timor, teve elevação patrimonial de 423%, passando de R$ 106,4 mil para R$ 557,1 mil. De acordo com sua assessoria, o crescimento se deve a suas atividades como comerciante.
A cem quilômetros de distância, em Rio Bonito, a prefeita Solange de Almeida declarou seis itens (R$ 146 mil) ao TSE quando se candidatou a vice em 2008. Na listagem de 2012, seus bens cresceram 120,5% (R$ 321,9 mil).
— Trabalhamos para aumentar o nosso patrimônio. Sou sócia com meu marido de uma clínica veterinária — alega Solange.
Este é o terceiro mandato dela. Solange mora numa casa de classe média alta, e sua rua não tem placa. A cidade, aliás, só tem um sinal de trânsito, instalado por Solange no seu segundo mandato:
— Temos problemas com a arrecadação.
Entre os investigados, há casos como o de Luciano Mota (PSDB), de Itaguaí, que em 2008 informou ter um patrimônio de pouco mais de R$ 6 mil. Ele foi flagrado com uma Ferrari, que foi apreendida pela PF. Há ainda oito prefeitos que tiveram redução de patrimônio, como Eduardo Paes (PMDB), do Rio, cujos bens caíram de R$ 390 mil para R$ 330 mil. Na declaração de 2008, cinco dos oito bens de Paes eram salas. Na mais recente, não aparecem imóveis. Por e-mail, a assessoria do prefeito diz que ele “não possui imóveis e o seu patrimônio se refere a aplicações financeiras”.
POLÍTICOS DE COFRES CHEIOS
Políticos investigados pela Operação Lava-Jato multiplicaram o patrimônio em até 22.000% (já descontada a inflação) em 12 anos. Levantamento feito pelo GLOBO revelou que os bens de 20 dos 48 citados pelo menos duplicou no período em que, segundo os delatores, vigorou o esquema de corrupção na Petrobras. A análise levou em consideração a eleição a partir de 2002, que foi a última antes do início das fraudes na estatal, que teriam começado dois anos depois.
Ao pesquisar as declarações de bens apresentadas pelos políticos à Justiça Eleitoral, a reportagem mostrou que o enriquecimento permitiu a compra de mansões, carros de luxo, lanchas e fazendas. O deputado federal Vander Louber (PT-MS) teve a maior evolução patrimonial. Em 2002, seus bens somavam R$ 2,3 mil. Em 2014, R$ 1,1 milhão.
Segunda no ranking, a governadora Roseana Sarney (PMDB-MA) teve um aumento patrimonial de 4.438%: de R$ 220 mil, em 2006, para R$ 9,9 milhões, em 2010. Já os bens de Aníbal Gomes (PMDB-CE) cresceram 2.266%: de R$ 366 mil para R$ 8,7 milhões.
Onze anos atrás, O GLOBO mostrou, na série “Os homens de bens da Alerj”, o enriquecimento de 113 políticos fluminenses — dos quais 27 aumentaram o patrimônio em mais de 100% entre 1996 e 2001. O trabalho de investigação levou quatro meses.
Com base nas declarações de renda entregues ao TRE, repórteres constataram que houve casos de parlamentares cuja renda crescera mais de 1.500% em cinco anos. O assunto foi alvo de investigações do Ministério Público estadual e da Receita Federal. A série, publicada a partir de 20 de junho de 2004, ganhou naquele ano o Prêmio Esso de Jornalismo e, em 2005, o Prêmio Internacional de Jornalismo Rey de España.
O prefeito de Sumidouro está no topo do ranking, com evolução patrimonial de 2.473,9%, segundo dados informados ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O valor dos seus bens passou de R$ 12.855 para R$ 330.889 de 2008 a 2012.
Já Miguel Alves Jeovani (PR), de Araruama, informou ter bens no valor de R$ 11,913 milhões. Um patrimônio 318% superior ao declarado no pleito de 2008: R$ 2,849 milhões. Ele não foi eleito em 2008, apenas em 2010, como deputado estadual. Na ocasião, declarou R$ 4,810 milhões em bens.
Já o prefeito de Carapebus, Amaro Fernandes (PRB), registrou em quatro anos um aumento patrimonial de R$ 61.400 para R$ 817.400. Um salto de 1.231%.
Juarez, de Sumidouro, tem uma explicação para a melhoria de sua situação. Diz que os R$ 13 mil que passou a receber em 2009, quando assumiu pela segunda vez a prefeitura — a gestão anterior foi de 2000 a 2004 —, lhe permitiram adquirir bens:
— Sou agente administrativo do INSS. Entre 2005 e 2008, vivi com o meu salário de R$ 2 mil.
Se as finanças pessoais do prefeito de Sumidouro vão bem, a situação da cidade segue caminho diferente. É o que estima o próprio administrador, que calcula em 10% a perda de receita este ano. Com isso, a ordem é apertar os cintos:
— Assinei decreto proibindo a prefeitura de fazer festas. Costumamos fazer principalmente exposições agropecuárias. Esperamos economizar R$ 2 milhões este ano.
Sobre as obras da rodoviária e os dois inquéritos em que é investigado no Ministério Público Federal, por crime de responsabilidade e contra a Lei de Licitações, Juarez não fez comentários.
Em Araruama, na entrada da cidade, uma placa com o nome do município está quebrada e pichada. Mais da metade das vias secundárias não tem calçamento, e a limpeza é deficiente. Quando disputou a eleição em 2008, Jeovani declarou 46 bens, incluindo nove casas e apartamentos. Em 2012, já listou 61. Por e-mail, a assessoria do prefeito disse que todos os seus bens “são declarados à Receita Federal. E sua renda vem de sua empresa de 25 anos, hoje administrada por sua família”. Ele é dono da rede de supermercados Só Ofertas.
Jeovani é alvo de quatro ações de improbidade no MP estadual. Em janeiro de 2014, foi afastado do cargo, mas retornou em julho, com liminar do STF. Ele é suspeito de irregularidades em licitação para a compra de merenda escolar.
Também na Região dos Lagos, a prefeita reeleita Franciane Conceição Gago Motta (PMDB), de Saquarema, teve uma evolução patrimonial de 360% em quatro anos. A mulher do secretário estadual de Governo, Paulo Melo, que afirmou ter bens no valor de R$ 103,8 mil em 2008, passou a declarar R$ 478,1 mil em 2012.
— Sou econômica e faço bons investimentos. A economia que faço na prefeitura faço em casa — argumenta Franciane, acrescentando que os bens foram declarados no Imposto de Renda.
EM RIO BONITO, SÓ UM SINAL DE TRÂNSITO
Na Baixada, o prefeito reeleito de Queimados também teve evolução patrimonial. Max Lemos (PMDB) saiu de R$ 250,339 mil em bens em 2008 para R$ 1,112 milhão em 2012 (344%). Por nota, a assessoria do prefeito alega que o resultado “é totalmente compatível com a renda da família”.
Em Japeri, cidade com o pior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do estado, o prefeito Ivaldo Barbosa dos Santos, o Timor, teve elevação patrimonial de 423%, passando de R$ 106,4 mil para R$ 557,1 mil. De acordo com sua assessoria, o crescimento se deve a suas atividades como comerciante.
A cem quilômetros de distância, em Rio Bonito, a prefeita Solange de Almeida declarou seis itens (R$ 146 mil) ao TSE quando se candidatou a vice em 2008. Na listagem de 2012, seus bens cresceram 120,5% (R$ 321,9 mil).
— Trabalhamos para aumentar o nosso patrimônio. Sou sócia com meu marido de uma clínica veterinária — alega Solange.
Este é o terceiro mandato dela. Solange mora numa casa de classe média alta, e sua rua não tem placa. A cidade, aliás, só tem um sinal de trânsito, instalado por Solange no seu segundo mandato:
— Temos problemas com a arrecadação.
Entre os investigados, há casos como o de Luciano Mota (PSDB), de Itaguaí, que em 2008 informou ter um patrimônio de pouco mais de R$ 6 mil. Ele foi flagrado com uma Ferrari, que foi apreendida pela PF. Há ainda oito prefeitos que tiveram redução de patrimônio, como Eduardo Paes (PMDB), do Rio, cujos bens caíram de R$ 390 mil para R$ 330 mil. Na declaração de 2008, cinco dos oito bens de Paes eram salas. Na mais recente, não aparecem imóveis. Por e-mail, a assessoria do prefeito diz que ele “não possui imóveis e o seu patrimônio se refere a aplicações financeiras”.
POLÍTICOS DE COFRES CHEIOS
Políticos investigados pela Operação Lava-Jato multiplicaram o patrimônio em até 22.000% (já descontada a inflação) em 12 anos. Levantamento feito pelo GLOBO revelou que os bens de 20 dos 48 citados pelo menos duplicou no período em que, segundo os delatores, vigorou o esquema de corrupção na Petrobras. A análise levou em consideração a eleição a partir de 2002, que foi a última antes do início das fraudes na estatal, que teriam começado dois anos depois.
Ao pesquisar as declarações de bens apresentadas pelos políticos à Justiça Eleitoral, a reportagem mostrou que o enriquecimento permitiu a compra de mansões, carros de luxo, lanchas e fazendas. O deputado federal Vander Louber (PT-MS) teve a maior evolução patrimonial. Em 2002, seus bens somavam R$ 2,3 mil. Em 2014, R$ 1,1 milhão.
Segunda no ranking, a governadora Roseana Sarney (PMDB-MA) teve um aumento patrimonial de 4.438%: de R$ 220 mil, em 2006, para R$ 9,9 milhões, em 2010. Já os bens de Aníbal Gomes (PMDB-CE) cresceram 2.266%: de R$ 366 mil para R$ 8,7 milhões.
Onze anos atrás, O GLOBO mostrou, na série “Os homens de bens da Alerj”, o enriquecimento de 113 políticos fluminenses — dos quais 27 aumentaram o patrimônio em mais de 100% entre 1996 e 2001. O trabalho de investigação levou quatro meses.
Com base nas declarações de renda entregues ao TRE, repórteres constataram que houve casos de parlamentares cuja renda crescera mais de 1.500% em cinco anos. O assunto foi alvo de investigações do Ministério Público estadual e da Receita Federal. A série, publicada a partir de 20 de junho de 2004, ganhou naquele ano o Prêmio Esso de Jornalismo e, em 2005, o Prêmio Internacional de Jornalismo Rey de España.
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