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Promotor de casos políticos afirma sofrer ‘punição política’

Eduardo Nepomuceno, que investigava suspeitas contra o patrimônio público em Minas, critica decisão que lhe impôs ‘remoção compulsória’


Luiz Maklouf Carvalho | O Estado de S.Paulo


BELO HORIZONTE - Faz tempo que o promotor Eduardo Nepomuceno de Sousa, do Ministério Público de Minas Gerais, não pode chegar perto dos processos nos quais se especializou ao longo de 14 anos – todos ligados a suspeitas de corrupção na área do patrimônio público, alguns envolvendo políticos do Estado. Nem dos processos, que estão parados, nem do local em que trabalhava, nem de nada relacionado a essa área específica.

 
Foto: WASHINGTON ALVES | ESTADAO CONTEUDO

Desde março, quando enfim se definiu seu destino profissional, Nepomuceno atende na 12.ª Promotoria de Juízo Criminal, em Belo Horizonte. Está às voltas com processos de furtos, roubos, tráfico ou homicídio.

Foi lotado na área em que é neófito em consequência de uma decisão do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), de 13 de dezembro do ano passado. A unanimidade de seus 14 conselheiros puniu o promotor com “remoção compulsória para outra promotoria que não possua atribuições na defesa do patrimônio público”.

Foi acusado, pelo relator Sérgio Ricardo de Souza, de paralisar e atrasar processos, de “falta de racionalidade” na condução de investigações, de violação de sigilo judicial, de tentativa de burla a garantias de conselheiros do Tribunal de Contas de Minas Gerais e de usurpação de atribuição de outros órgãos.

‘Injustiça’

Em uma friorenta sexta-feira de junho lá estava o promotor Nepomuceno, com toga e tudo, em um júri no Tribunal de Justiça, centro de Belo Horizonte, pedindo (e conseguindo) a condenação de um traficante acusado de homicídio doloso. “Sinto-me injustiçado, porque a decisão do CNMP foi política e atendeu a interesses de políticos poderosos descontentes com as investigações”, disse Nepomuceno ao Estado (leia entrevista nesta página). “Ao mesmo tempo em que recorro, estou me dedicando à nova função.”

Um dos que votaram pela remoção compulsória de Nepomuceno foi o corregedor do CNMP, Cláudio Portela. “Dizer que a decisão foi política é tentar denegrir a imagem do CNMP”, afirmou à reportagem. Ele é o responsável pela chegada do processo disciplinar contra Nepomuceno ao CNMP.

O caso estava parado no MP estadual – onde, em junho de 2015, o corregedor Luiz Antônio Sasdelli Prudente abriu um processo disciplinar em que pedia a disponibilidade compulsória do colega, pena máxima.

Cinco procuradores foram indicados para relatar o processo. Nenhum aceitou, alegando suspeição – seja por solidariedade a Nepomuceno, seja por espírito de corpo.

O caso poderia estar por lá até hoje, vá saber, mas em novembro de 2015, diante do impasse, Portela o avocou para o CNMP. “Avoquei para que você tenha um julgamento isento, longe das pressões locais”, disse Portela ao promotor, segundo contou ao Estado.

O promotor ouviu outra frase: “Quem trabalha como você não vai ser punido”. Portela nega que a tenha dito: “Como eu poderia me arvorar a adivinhar o voto dos conselheiros?”, perguntou. E lembrou, para arguir distanciamento, que por meia dúzia de vezes mandou arquivar representações do senador Zezé Perrella (PMDB-MG) contra Nepomuceno, “por achar que não tinham fundamento”.

Perrella já foi alvo de ações do promotor e, desde sempre, um ferrenho adversário público do promotor. A reportagem não conseguiu contato ontem com o senador.

O relator do processo no CNMP, Sérgio Ricardo de Souza, é juiz no Espírito Santo. Seu primeiro ato, em 16 de dezembro de 2015, foi nomear uma comissão de três integrantes – o procurador Gilberto Valente Martins, ex-conselheiro do CNMP e hoje procurador-geral de Justiça do Pará; a procuradora da República Meliza Alves Barbosa Pessoa e o promotor Arthur Pinto de Lemos Junior, do MP de São Paulo.

A comissão atuou por 180 dias, em Belo Horizonte. Afirmou, em um relatório alentado e circunstanciado de 27 de junho de 2016, não ter ficado demonstrado que “o requerido atuou de maneira relapsa ou negligente, que tenha tido um comportamento prejudicial à boa imagem da instituição, que tenha invadido atribuições de outros órgãos ou que tenha violado qualquer obrigação de caráter funcional”. Propôs, por unanimidade dos três integrantes, “que o processado deveria ser absolvido, por não vislumbrar desídia, culpa ou dolo no desempenho de suas atribuições”.

O voto do relator, apresentado ao pleno do CNMP em 13 de dezembro, ignorou solenemente o relatório da comissão – um direito do relator – e foi aprovado por unanimidade, com a remoção compulsória de Nepomuceno.

Laços

O relator, juiz e conselheiro é amigo de outro adversário de Nepomuceno: o também promotor Glaydson Santo Soprani Massaria, do MP de Contas de Minas Gerais. Foi o primeiro a representar contra Nepomuceno na Corregedoria do MP-MG. Massaria e Souza ficaram amigos em 2004, quando este último foi seu orientador em monografia na Escola de Magistratura do Espírito Santo. Massaria não deu resposta ao pedido de entrevista.

O juiz e conselheiro do CNMP não concordou em falar diretamente nem em responder, pela assessoria, sobre a relação com Massaria, um dos interessados no caso. Em e-mail enviado pela assessoria, disse que “o voto do relator não está vinculado ao relatório da comissão processante. A comissão faz um trabalho opinativo”.

Afirmou, também, “que a decisão já foi, inclusive, objeto do Mandado de Segurança n.º 34.583, ajuizado pelo promotor de Justiça no Supremo Tribunal Federal, e denegado”. Faltou dizer que o promotor recorre dessa decisão.


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