Licitação para 119 pontes em estradas vicinais somava R$ 153,9 milhões, enquanto custo real seria de R$ 90,4 milhões
PMDB maranhense deu à Procuradoria documento que teria vazado do governo sobre contrato firmado com a construtora Gautama
ELVIRA LOBATO
ENVIADA ESPECIAL A SÃO LUÍS
O grupo político do senador José Sarney no Maranhão entregou ao Ministério Público Federal, em Brasília, em agosto do ano passado, um documento, supostamente vazado da Secretaria de Infra-Estrutura do governo do Estado, que aponta superfaturamento de R$ 63 milhões no contrato da Gautama para construção de 119 pontes em estradas vicinais.
A Gautama é o pivô da Operação Navalha, da Polícia Federal, que prendeu na quinta-feira 46 pessoas suspeitas de fraudar licitações em Estados e de desviar recursos públicos federais.
Segundo o documento, obtido pela Folha, as pontes foram orçadas em R$ 153,9 milhões pela Gautama, na licitação, quando os valores de referência de preço de construção usados pelo próprio Estado apontavam um custo total de R$ 90,416 milhões.
A relação das obras, com preços de custo e percentuais de superfaturamento de cada ponte, está em papel timbrado do governo, e foi anexada à representação ao procurador-geral da República, assinada pelo presidente do PMDB do Maranhão, Remi Oliveira, do grupo político de Sarney.
O ex-presidente José Sarney está rompido com o ex-governador José Reinaldo Tavares (PSB) desde 2004, e atribui a ele a derrota de sua filha, Roseana Sarney para Jackson Lago (PDT) na eleição para governador no ano passado. Sarney já se referiu a Tavares, de quem foi aliado por 40 anos, como "judas andrajoso e repugnante" e "traidor que perdeu o caráter e todos os valores".
Tavares foi preso na Operação Navalha, sob suspeita de ter recebido um automóvel da Gautama, no valor de R$ 110 mil. Dois sobrinhos de Jackson Lago foram presos na mesma operação, porque teriam recebido R$ 240 mil da construtora, supostamente, a mando do governador.
O deputado estadual Ricardo Murad (PMDB-MA), cunhado da senadora Roseana Sarney, disse que o documento sobre o superfaturamento das pontes foi feito por engenheiros da Secretaria de Infra-Estrutura, cujo titular também foi preso pela PF na Operação Navalha- que estariam inconformados com o sobrepreço das obras.
Indagado como o partido obteve documentos internos do governo estadual, Ricardo Murad diz que "tudo vaza" no governo. Para comprovar a tese, mostrou cópia de um ofício do ex-secretário de Infra-Estrutura, João Dominici, de agosto de 2004, que proibia os funcionários de copiarem documentos sem autorização dele, numa inútil tentativa, de impedir o vazamento de papéis.
Além do superfaturamento dos preços, há denúncia de pontes construídas longe de estradas ou sem estradas de acesso a elas. Em 2005, o Ministério Público Federal recebeu pedido de investigação do Ministério Público Estadual de superfaturamento de 50% na construção, com verbas federais, de uma ponte sobre o riacho Barro Duro, município de Tutóia, ao custo de R$ 1,5 milhão. O MPF no Maranhão ainda examina se os recursos que financiaram a obra são federais ou estaduais.
Não se sabe quantas das 119 pontes licitadas em 2003 foram construídas e pagas à Gautama. Com a prisão do secretário de Infra-Estrutura, na Operação Navalha, a assessoria do governador Jackson Lago informou que não havia pessoa autorizada a fornecer as informações. Entre as pontes licitadas, há estimativas de superfaturamento de até 130%.
Segundo a denúncia encaminhada pelo grupo Sarney, o superfaturamento estaria embutida no preço da laje e das vigas, feito por metro quadrado, "sem guardar qualquer relação com os preços compostos em metro cúbico, que é a unidade utilizada para o concreto armado".
Surpresa
O advogado do PMDB maranhense, Marcos Lobo, disse que foi uma surpresa para o partido o envolvimento de membros do atual governo no escândalo da Gautama. Segundo ele, a representação citava apenas o ex-governador, José Reinaldo Tavares, a ex-mulher dele, Alexandra Tavares, o ex-secretário de Infra-Estrutura e cunhado de Tavares, João Dominici. Segundo o advogado, o PMDB desconhecia que o suposto esquema de propina tinha se mantido no atual governo, empossado neste ano.
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