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De guerrilheira explosiva a poderosa mãe do PAC

Ministra da Casa Civil é temida não só por causa do poder que acumula, mas pela personalidade intempestiva no dia-a-dia

Ugo Braga
Da equipe do Correio braziliense

As articulações do governo em torno da ida da chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, ao Congresso revelaram uma face oculta da personalidade política da “mãe do PAC”: ela tem tão pouca habilidade para dialogar com divergentes que chegou mesmo a temer o açoite dos oposicionistas na Comissão de Infra-Estrutura do Senado. O medo, no caso, era o de ela perder a fleuma ao ser provocada e destruir sua própria candidatura presidencial, ainda em construção.

O potencial explosivo de Dilma virou motivo de aflição especialmente entre os funcionários mais humildes do Planalto — secretárias, copeiros e garçons. Recentemente, a ministra iniciara uma reunião com um colega da Esplanada e mais um grupo de técnicos quando o garçom serviu chá aos presentes.

Dilma alongou-se na exposição sem sorver uma gota do líquido, que esfriou. O garçom, atento, entrou na sala e recolheu todas as louças, inclusive a da ministra. Ela, então, interrompeu o encontro e vociferou uma bronca homérica no serviçal, diante da platéia constrangida.

Entre os servidores do Planalto ninguém acha mais graça na história que virou uma norma.

Agora, serventes provam abacaxis para certificar se estão maduros. Tudo por causa de insultos ouvidos da ministra em duas ou três ocasiões em que foi servido suco que ela julgou azedo. As assessoras tremem quando ela, impaciente, as chama com o prefixo de “santinha”. É a senha de que o tempo vai fechar.

Embora o tom das queixas amenize quando o interlocutor detém cargo maior na hierarquia, diz-se nos bastidores palacianos que um dos ministros em cuja pasta estão alocados bilhões de reais do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) já ouviu impropérios da chefe da Casa Civil em reuniões de trabalho. O mesmo teria ocorrido com um secretário do Ministério da Fazenda e, em grau mais elevado, com o presidente da Infraero, Sérgio Gaudenzi.

Pito

Quando o atual coordenador político do governo, José Múcio Monteiro, assumiu o cargo, recebeu um telefonema duro da colega. Em tom de desabafo, ele contou a confidentes ter ouvido um pito humilhante. A ministra achava que ele divulgara informações que ela não queria ver no noticiário. “Não confiarei em você nunca mais”, teria dito, batendo o telefone.

A rudeza é um traço adquirido na maturidade. Na infância, a hoje temida ministra era apenas Dilminha, a tímida filha de seu Pedro, um búlgaro naturalizado brasileiro, advogado de fala enrolada e fama de bravo, morador da Rua Major Lopes, em Belo Horizonte. É uma rua de classe média típica, onde as moças iam a pé à escola — Colégio Sion, hoje Santa Dorothéia, um dos mais tradicionais da capital mineira — e divertiam-se na “hora dançante”, à tardinha.

A doce felicidade da Rua Major Lopes acabou para Dilma em meados da década de 1960, quando ela trocou o exclusivo para moças Sion pelo misto Colégio Estadual. E depois, seguindo a trilha, ingressou no curso de economia da Universidade Federal de Minas Gerais. O movimento estudantil borbulhava. No meio dele, a guerrilheira “Estella” nasceu.

Dilma entrou para a luta política não pelas vias sindicais ou associações classistas. Foi recrutada pelo então namorado (depois marido), Cláudio Galeno de Magalhães Linhares, para militar no Política Operária (Polop), grupo marxista. Desentendimentos sobre os rumos da resistência fizeram nascer o Comando de Libertação Nacional (Colina), ao qual Dilma, ou Estella, perfilou-se, junto com Cláudio. A mocinha da Rua Major Lopes agora dava aulas de marxismo nas células comunistas. Perseguido pela polícia mineira, o casal fugiu para o Rio e caiu na clandestinidade.

No Rio, já alçada ao topo do Colina, Estella planeja três assaltos a bancos — dinheiro que financiava as atividades da conspiração. Diante das bem-sucedidas operações do Colina, outros grupos marxistas se integraram. O comando chefiado por Dilma se funde à Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), onde despontava o já famoso capitão Carlos Lamarca, adepto da tomada do poder pelas armas.

Surge daí a Vanguarda Armada Revolucionária — Palmares (VAR-Palmares), da qual Estella e Lamarca são os líderes, junto com um gaúcho chamado Carlos Araújo.

Operação

Em julho de 1969, três carros com 11 guerrilheiros da VAR-Palmares estacionam em frente à casa no bairro carioca de Santa Teresa onde morava um irmão de Ana Capriglioni, notória amante do ex- governador de São Paulo Adhemar de Barros. Lá, executando uma operação minuciosamente planejada por Estella, que não tomou parte na ação, a VAR-Palmares rouba um cofre de chumbo pesando 300kg, recheado com uma bolada de US$ 2,5 milhões.

Pouco tempo depois, a VAR-Palmares se desintegra, por desentendimentos entre Estella e Lamarca. A maior parte do grupo segue Estella — na época, Cláudio, o primeiro marido, partira para Cuba a bordo de um avião seqüestrado e Dilma já se enamorava de Carlos, o gaúcho da VAR-Palmares (com quem veio a se casar e com quem teve Paula, a única filha, hoje juíza do Trabalho em Porto Alegre, e de quem se separou já depois da redemocratização).

Nos primeiros dias de 1970, em São Paulo, Estella é presa e levada para a Operação Bandeirantes (Oban). É interrogada várias vezes. Puseram-na no pau-de-arara. Surraram-na e deram-lhe choques. Foi julgada e condenada a seis anos de cadeia por subversão. Entrou com recurso e reduziu a pena para dois anos e um mês. Já havia cumprido três anos. Solta em 1973, transferiu-se para Porto Alegre, junto com o marido, que posteriormente filiado ao PDT elegeu-se deputado estadual.

Dilma retomou no Sul a vida acadêmica interrompida. Formou-se em economia, fez mestrado em teoria econômica na Unicamp, onde conclui doutorado em economia monetária e financeira. Rompeu com o PDT quando, secretária de Minas e Energia do governo Olívio Dutra (1999-2002), o partido desfez a aliança com o PT e exigiu a entrega dos cargos. Ela ficou e filiou-se ao partido do governador. Nascia a Dama de Ferro que Lula quer ver no Planalto a partir de 1º de janeiro de 2011.
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