Delegado "limpa" teorias de Protógenes e se concentra em supostos crimes de banqueiro
Dono do Opportunity é acusado também de gestão fraudulenta; procurador diz que inquérito está sendo aprofundado, e não refeito
MARIO CESAR CARVALHO
DA REPORTAGEM LOCAL
Esqueça as idéias grandiloquentes de conspiração e o apelo de chamar banqueiro de "capo" (chefe mafioso) - características que contribuíram para tornar folclórico o inquérito do delegado Protógenes Queiroz sobre a Operação Satiagraha. O novo relatório da Polícia Federal sobre Daniel Dantas é seco como um artigo do Código Penal. Em vez de teorias e especulações, o delegado Ricardo Saadi se concentra em descrever os crimes principais que a PF atribui ao banqueiro: gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro.
O relatório de 243 páginas e cinco anexos foi entregue gravado em CD na última sexta-feira ao juiz federal Fausto Martin De Sanctis, da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, e está agora com o Ministério Público Federal.
No documento, uma atividade aparentemente paralela de Dantas ganha relevância central: a Agropecuária Santa Bárbara Xinguara, empresa que em três anos se tornou proprietária de um dos maiores rebanhos do mundo, com cerca 500 mil cabeças, segundo Dantas, ou 1 milhão, de acordo com estimativas do mercado.
A agropecuária é apontada como peça central na suposta lavagem de dinheiro que a PF atribui a Dantas. Segundo a investigação da PF, Dantas chegou a reunir cerca de US$ 800 milhões num fundo de investimento nas Ilhas Cayman.
Parte do lucro obtido nessa operação retornou para o Brasil e foi aplicada em gado, ainda de acordo com a PF. Especialistas em lavagem de dinheiro dizem que gado é uma das melhores formas de converter recursos sem origem em dinheiro limpo. A maneira clássica de lavar dinheiro com gado é inventar novilhos. O empresário pode inventar que nasceram 300 mil cabeças no seu rebanho, o que é virtualmente impossível de ser checado. A simulação da venda dos novilhos fictícios serve para esquentar o dinheiro sem origem que teria vindo de paraíso fiscal, segundo a PF.
A suposta gestão fraudulenta do Banco Opportunity é descrita no relatório, segundo relatos de policiais, a partir do que a PF chama de "remessas ilegais" de recursos para o Opportunity Fund, nas Ilhas Cayman. Esse fundo só podia receber recursos de estrangeiros ou de brasileiros residentes fora do país, mas essa norma da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) foi violada, segundo a PF.
Perícia da PF concluiu que o fundo recebeu recursos de brasileiros no Brasil. Também caracterizam gestão fraudulenta, para a PF, os empréstimos que o Opportunity fez para empresas do próprio Dantas - o que é vetado pelo Banco Central.
As principais questões apresentadas no relatório da PF foram investigadas por Protógenes e já faziam parte do inquérito que se tornou polêmico pelo estilo derramado e conspiratório. Os documentos apreendidos pela PF no dia em que a Operação Satiagraha foi deflagrada, no dia 8 de julho deste ano, são citados brevemente.
A PF ainda não conseguiu abrir os discos rígidos que apreendeu no apartamento de Dantas nem passaram por perícia os computadores recolhidos em julho. Por conta da demora da perícia, é provável que o inquérito sobre Dantas só seja concluído no próximo ano.
Aprofundamento
Assim como os policiais que participam da investigação, o procurador da República Rodrigo de Grandis refutou ontem a idéia difundida pelo ministro Tarso Genro (Justiça) de que Saadi estava "refazendo" o inquérito de Protógenes.
"Não tem nada a ver [com refazer]. O que há agora é um aprofundamento do que já foi feito. As investigações da Satiagraha foram os primeiros passos. É natural que agora se priorize alguns aspectos", disse após evento no Ministério Público. De Grandis ressaltou que nenhuma prova do inquérito de Protógenes será descartada.
O juiz De Sanctis não quis se pronunciar ontem. Apenas confirmou ter recebido o relatório parcial da PF e o encaminhado ao Ministério Público.
Colaborou CLAUDIO DANTAS SEQUEIRA, da Reportagem Local
AGRONEGÓCIOS DE DANIEL DANTAS ESTÃO NA MIRA DA JUSTIÇA DO PA
Braço agropecuário das empresas de Daniel Dantas, a Agropecuária Santa Bárbara Xinguara S.A. é alvo de questionamento judicial sobre a legalidade de suas terras e de ações de movimentos sociais. Dona de mais de 400 mil cabeças de gado e de 510 mil hectares de terra no Pará - equivalente a pouco mais de três cidades de São Paulo - a agropecuária é ré em uma ação civil pública movida pelo governo paraense. O Estado reivindica para si o domínio completo sobre duas fazendas do grupo em Xinguara (646 km de Belém).
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