Moreira Mendes, do PPS, admite que recebeu ‘sugestões’ da CBC
Rosa Costa, BRASÍLIA
Troca de e-mails entre o deputado Moreira Mendes (PPS-RO) e o diretor comercial da Companhia Brasileira de Cartuchos (CBC), Salesio Nuhs, revela como age o lobby das armas no Congresso Nacional e a existência de certa sincronia entre doações eleitorais e atuação parlamentar.
Obtida pelo Estado, a correspondência eletrônica tem três páginas de orientações de como Moreira Mendes, integrante da estratégica Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), deve se comportar na Câmara dos Deputados para ajudar a barrar e alterar projetos de lei que contrariam os interesses da CBC. A CBC é a segunda maior financiadora de Mendes, com quatro doações, no total de R$ 50 mil, de acordo com a prestação de contas divulgada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Num dos textos, Nuhs relata o desagrado com três projetos examinados pela Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, que numa etapa seguinte serão analisados pela CCJ. O representante da empresa, que praticamente detém o monopólio da produção de munições no Brasil, orientou Moreira a contestar a campanha do governo sobre a lei que trata do recadastramento de armas.
No e-mail, o empresário orienta o deputado a trabalhar pela rejeição da proposta que trata da instalação de dispositivo de identificação e rastreamento em armas de uso exclusivo das Forças Armadas. Diz que é para pressionar pela rejeição do parecer do deputado Neilton Mulim (PR-RJ), contrário ao projeto que autoriza o porte de arma de fogo aos integrantes das empresas de segurança privada e de transporte de valores, agentes e guardas prisionais, escolta de presos e guardas portuários.
Finalmente, Nuhs indica a aprovação do parecer da deputada Marina Maggessi (PPS-RJ), que permite a doação de armas de fogo, acessórios e munição apreendida para as Polícias Civil, Federal e Militar, visando ao combate ao crime, desde que alterado com cinco emendas. Mas faz uma ressalva: pede que seja alterado o dispositivo que permite a doação de munição, “pois ninguém sabe o estado da munição e pode gerar graves problemas/acidentes”.
O diretor da CBC diz, no tópico que aborda a propaganda do governo pelo desarmamento, que “ela alerta para o desarmamento e deixa de lado o recadastramento”. “Tem de falar dos dois lados. Ou entrega a arma ou registra e a campanha não está sendo feita dessa forma e acaba mistificando o estatuto do controle de armas e munição.”
Como reforço a sua pregação, Nuhs manda para o deputado noticiário da imprensa que, entende, pode ser utilizado para expor as contradições do governo sobre o uso de armas. É o caso de um trecho de telejornal do SBT de 28 de agosto segundo o qual o “ministro da Justiça, Tarso Genro, responsável e ferrenho apoiador da campanha de desarmamento, possui em seu nome um revólver e uma pistola”. As idéias foram empregadas no texto publicado pelo deputado na sua página no site da Câmara dos Deputados.
Moreira Mendes negou condicionar o voto ou sua atuação parlamentar às determinações da empresa doadora. “Orientado, não”, retrucou o parlamentar. “A CBC pode sugerir. Ninguém me orienta. Sou muito cônscio do meu papel, tenho posição clara a respeito de armas e ninguém me orienta”, completou.
O deputado disse que, como membro da Comissão de Constituição e Justiça, fala com seus colegas sobre o assunto. “Mas não que alguém me oriente. Pode ter me mandado o e-mail como sugestão.” Ao Estado, o deputado reconheceu que recebeu os e-mails. Procurado pela reportagem, o diretor da CBC não retornou a ligação.
TRANSPARENTE
Para o presidente do PPS, Roberto Freire, uma agravante da situação é o fato de o partido ser a favor do desarmamento, embora não seja questão fechada. “Espero que ele (Moreira Mendes) nos procure e esclareça os fatos, mostre que não está subordinado a nenhum tipo de lobby”, afirmou. Se o lobby estivesse regulamentado, Freire acredita que tudo que estivesse relacionado a esse tipo de atividade “seria mais transparente”.
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