Dinheiro teria ficado guardado no apartamento do ex-prefeito até que a empresa passou a ser investigada pelo MPE
Artur Rodrigues, Bruno Ribeiro e Fábio Leite | O Estado de S. Paulo
SÃO PAULO - Uma testemunha protegida afirmou em depoimento ao Ministério Público Estadual (MPE) que o ex-prefeito paulistano Gilberto Kassab (PSD) recebeu "uma verdadeira fortuna" da empresa Controlar, responsável pela inspeção veicular na capital, e que o dinheiro ficou guardado em seu apartamento até que a empresa passou a ser investigada pelo MPE. Quando isso ocorreu, ainda segundo a testemunha, Kassab pediu ajuda ao empresário Marco Aurélio Garcia, irmão do secretário de Estado de Desenvolvimento Econômico, Rodrigo Garcia, para levar o dinheiro até uma fazenda no Mato Grosso, de avião.
O auditor fiscal Ronilson Bezerra Rodrigues, investigado por supostamente liderar a máfia do ISS, disse à testemunha "em tom de anedota, que o avião teve dificuldade de decolar em razão da quantidade de dinheiro embarcada", de acordo com o depoimento, que consta no Procedimento Investigatório Criminal (PIC) 03/2013 do MPE, que apura a máfia do ISS.
O contrato da Prefeitura com a Controlar é questionado pelo MPE por ter sido assinado de forma irregular. A contratação da empresa, em 2007, foi feita a partir de uma licitação na gestão Paulo Maluf, em 1996, que estava congelado. Para a Promotoria, deveria ter sido feita uma nova licitação.
A testemunha relatou estreita ligação entre Kassab e Rodrigues. Disse que o escritório que os fiscais da máfia do ISS usavam, no Largo da Misericórdia, centro da capital, chamado de "ninho", era usado por Kassab antes de a máfia ocupar o imóvel. O locatário da sala é Marco Aurélio. O secretário Garcia foi, durante anos, o principal aliado político e sócio de Kassab. Ambos faziam campanha juntos e só romperam politicamente em 2011.
Segundo o relato, Kassab chegou a ignorar denúncias de corrupção na Secretaria Municipal de Finanças, a pedido de Rodrigues. "Em dada situação, Kassab recebeu uma fita de filmagem em que um auditor fiscal havia achacado uma empresa de segurança. Diante daquela prova cabal de corrupção, Ronilson pediu que Kassab não prosseguisse com a investigação porque o auditor seria um amigo seu. Kassab acolheu a justificativa mas determinou que Ronilson 'segurasse seu pessoal, pois estamos em ano eleitoral'", diz o depoimento.
Em outro trecho, a testemunha afirma que "Kassab pediu que Ronilson fosse a uma reunião com representantes de empresas no restaurante Girarrosto. Ronilson perguntou a Kassab do que se tratava e o Prefeito lhe disse: 'vai lá e resolve, cumpra as minhas ordens'. Ronilson foi até o local e inteirou-se do assunto descobrindo que na verdade era um pedido para que fosse abortada uma fiscalização em um determinado estabelecimento. Ronilson cumpriu a ordem". O relato segue. "Kassab perguntou para Ronilson quanto poderia ser cobrado da empresa e Ronilson disse que poderiam ser cobrado milhões."
Os fatos trazidos pela testemunha serão analisados pelo Ministério Público Estadual, que investiga tanto a máfia do ISS quanto a Controlar, em procedimentos diferentes.
Resposta. Em nota, o ex-prefeito diz que "o conteúdo do depoimento, cuja autoria nem sequer é conhecida, é falso e fantasioso".
"O ex-prefeito de São Paulo repudia as tentativas sórdidas de envolver, de forma contumaz, o seu nome em suspeita de irregularidades que pesem contra funcionários públicos municipais admitidos há anos por concurso, cujo objetivo escuso é única e exclusivamente atingir a sua imagem e honra", continua o texto, em que Kassab afirma que irá se defender na Justiça das acusações.
Na nota, Kassab diz que foi na gestão dele que teve início as investigações sobre a máfia do ISS e que faz dez anos que ele não mantém contato com o empresário Marco Aurélio Garcia.
Sobre a Controlar, a nota diz que "o programa de Inspeção Veicular reduziu mortes e internações na cidade de São Paulo, conforme estudo realizado por pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP".
O empresário Marco Aurélio Garcia e a empresa Controlar também foram contatadas para comentar o depoimento, mas nenhum deles respondeu até as 20h30.
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