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Delator da Operação Sevandija fala em arrependimento e diz ter sido seduzido

Esquema desviou R$ 45 milhões dos cofres públicos de Ribeirão, diz MP.
Quatro pessoas, entre elas a prefeita Dárcy Vera (PSD), foram presas.


Do G1 Ribeirão e Franca

O presidente afastado do Sindicato dos Servidores Municipais de Ribeirão Preto (SP), Wagner Rodrigues, delator da Operação Sevandija e peça-chave da investigação, divulgou nota neste sábado (3) em que se diz arrependido do envolvimento no esquema que, segundo o Ministério Público, desviou R$ 45 milhões dos cofres da prefeitura para favorecer a ele e a um grupo que inclui a prefeita Dárcy Vera (PSD).


Candidato a prefeito de Ribeirão Preto, Wagner Rodrigues (PC do B) (Foto: Reprodução/EPTV)
Wagner Rodrigues foi candidato à prefeitura de Ribeirão Preto pelo PCdoB (Foto: Reprodução/EPTV)

“Errei, porque aceitei a possibilidade de ser remunerado pela pessoa que seria a mais favorecida: a ex-advogada do sindicato”, diz Rodrigues em trecho que cita Maria Zuely Alves Librandi, mentora e beneficiada dos honorários advocatícios indevidos pagos pela Prefeitura. Ela moveu uma ação no ano de 1997 em nome de servidores públicos que exigiam a reposição de perdas salariais do Plano Collor. “Meu erro foi ter sido seduzido para encerrar uma luta que, na Justiça, poderia ser indevida”, afirma.

Segundo o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), planilhas apreendidas pela força-tarefa da Operação Sevandija comprovam o que Rodrigues declarou em delação premiada. Em um dos trechos da documentação, ele afirma que foram acertados os pagamentos de R$ 7 milhões para a prefeita, R$ 2 milhões para o ex-secretário de Administração, Marco Antônio dos Santos, e R$ 11,8 milhões para serem divididos entre ele e o ex-advogado do sindicato, Sandro Rovani.

Maria Zuely, Santos e Rovani foram presos pela Polícia Federal (PF) nesta sexta-feira (2) em Ribeirão Preto. Eles, além de Rodrigues e do advogado André Soares Hentz, são acusados de peculato, corrupção passiva e ativa, falsidade ideológica e associação criminosa. O pedido de prisão de Hentz foi negado pela Justiça.

Já a prefeita Dárcy Vera foi presa a pedido da Procuradoria-Geral de Justiça. Ela foi denunciada por peculato, associação criminosa e corrupção passiva, além de ter sido afastada do cargo.

A defesa de Santos disse que não vai se pronunciar porque o caso corre em segredo de Justiça. Os advogados de Rovani e de Maria Zuely informaram que vão entrar com pedido de habeas corpus. O advogado André Soares Hentz não foi localizado para comentar o assunto. A defesa da prefeita disse que Dárcy Vera tem meios para comprovar sua inocência.

Delação premiada

 
Inicialmente, a Operação Sevandija suspeitava que agentes públicos responsáveis por liberar os pagamentos do acordo judicial exigiam que Maria Zuely, que representou os servidores municipais na ação movida em 1997, pagasse propina para receber os valores que lhe eram devidos na causa.

Entretanto, documentos apreendidos apontaram que, na verdade, houve um acerto entre as partes muito antes dessa decisão judicial. Para o Gaeco, o acordo só ocorreu para que o valor total dos honorários, cerca de R$ 69,9 milhões, fosse desviado dos cofres públicos e dividido entre os envolvidos.

"Eles forjaram um termo de aditamento ao acordo original, de 2008, da gestão do prefeito [Welson] Gasparini, para que fosse possível, através de um falso consenso, desviar parte dos valores pagos aos servidores, decorrentes daquela ação, para o pagamento de honorários dessa profissional", afirmou o promotor Gabriel Rigoldi Vidal.

Segundo o MP, o contrato firmado para que Maria Zuely trabalhasse para o sindicato excluía qualquer possibilidade de cobrança de honorários por parte da advogada a servidores. Entretanto, em 2003, após o Tribunal de Justiça (TJ) dar ganho à causa movida por 3,5 mil funcionários públicos contra a prefeitura para exigir o pagamento das diferenças decorrentes do Plano Collor, Maria Zuely entrou em uma disputa para receber os valores que alegava serem seus por direito.

Ela contratou o advogado André Soares Hentz para representá-la na ação de cobrança dos honorários, mas a causa sofreu consecutivas derrotas até que os recursos na primeira e na segunda instância foram esgotados.

A partir da delação premiada de Wagner Rodrigues, a força-tarefa apreendeu provas de que Maria Zuely e Hentz procuraram os outros envolvidos e passaram a prometer vantagens pra que pudessem receber o dinheiro. Segundo o sindicalista, em reuniões na Prefeitura de Ribeirão Preto e no escritório do advogado, Rovani, Rodrigues e Santos definiram como seria feito o “termo de aditamento de acordo” para incluir o pagamento dos honorários.

Segundo Rodrigues, o documento foi assinado pela prefeita Dárcy Vera em seu gabinete. A chefe do Executivo tinha pleno conhecimento da manobra feita para garantir os pagamentos para que o grupo fosse privilegiado. 

Segundo Rodrigues, Dárcy tinha conhecimento de manobra para pagar honorários advocatícios (Foto: Reprodução)
Segundo Rodrigues, Dárcy tinha conhecimento de manobra para pagar honorários advocatícios (Foto: Reprodução)

Em sua delação, Rodrigues informou que a ata de uma assembleia realizada no dia 20 de março de 2012 foi adulterada por ele junto com o então advogado do sindicato, Sandro Rovani. Em votação anterior, os servidores já haviam decidido que não pagariam honorários advocatícios a Maria Zuely. Mas, um parágrafo afirmando que os trabalhadores decidiram pela cessão dos valores devidos foi incluído no documento. O assunto sequer foi mencionado para discussão no documento original, que tratou apenas do reajuste salarial do funcionalismo.

Segundo a promotoria, o termo de aditamento previa redução dos juros de mora de 6% para 3%, e esse valor seria destinado à Maria Zuely, cerca de R$ 58 milhões. Entretanto, o então secretário de Administração se utilizou de um jogo de planilhas e elevou o valor para R$ 69 milhões.

De acordo com o Gaeco, todos os documentos apresentados induziram a Justiça a erro e o pagamento dos honorários milionários foi autorizado. Com isso, segundo o MP, a quadrilha manteve os desvios planejados por anos a fio, inclusive porque o desvio do dinheiro público foi executado em parcelas mensais e o plano criminoso exigiu cumplicidade e organização de janeiro de 2009 a agosto de 2016.

O promotor Leonardo Romanelli afirmou que a análise bancária dos suspeitos, assim como documentos apreendidos, apontam que o valor dos honorários era depositado mensalmente na conta de Maria Zuely, e então entregue aos demais envolvidos em dinheiro ou cheques. As quantias eram usadas para compra de bens.

Além do desvio de R$ 45 milhões dos cofres públicos, o esquema gerou um prejuízo de R$ 120 milhões aos servidores, que foram privados de receber os 6% de juros de mora referentes ao acordo inicial.

Leia abaixo a íntegra da carta divulgada por Wagner Rodrigues:

Já se diz por aí que o arrependimento é a chave que abre qualquer fechadura. Desde o início das investigações, compartilhando esse propósito com o meu advogado, decidi contribuir de forma eficaz com a Justiça brasileira. Gostaria de tornar público que o acordo homologado pela Justiça em 2012 não foi prejudicial a todos os servidores públicos municipais de RP. Meu erro foi ter sido seduzido para encerrar uma luta que na Justiça poderia ser indevida.

Porém, na época, acreditei que o inverso também poderia ocorrer e os servidores também pudessem ser mais penalizados. Lógico, se isso tivesse ocorrido, a decisão não teria sido minha, mas da Justiça. Porém, os efeitos poderiam ser mais graves, uma vez que o resultado dessa ação de cobrança dos honorários advocatícios por parte da advogada era uma incógnita e ainda é.

No momento da assinatura do acordo não havia uma palavra final da Justiça a esse respeito e nem hoje. Em outras palavras, só a Justiça poderia ter dado a palavra final sobre o direito da advogada aos seus honorários e o pedido original dela era de 10% de honorários sobre cada ação para os beneficiários do processo dos 28% que já haviam vendido os seus créditos para os bancos credenciados a questão dos juros. Não tinha mais significado algum em 2012.

Para quem já havia vendido os seus créditos, os juros não era mais deles, e, sim, os juros eram contabilizados para aumentar o faturamento dos bancos que os haviam comprado e para os poucos beneficiados no processo dos 28% que ainda não haviam negociado os créditos com os bancos, abrir mão de 3% de juros para o pagamento de honorários daquele ano em diante parecia mais adequado do que correr o risco real de pagamento de honorários na casa de 10% desde o início do pagamento do processo.

Errei, porque aceitei a possibilidade de ser remunerado pela pessoa que seria a mais favorecida, a ex-advogada do sindicato. reitero tudo o que disse ao Ministério Público, inclusive que não tenho bens materiais ou financeiros. Optei em total demonstração de colaboração espontaneamente, abrir mão de todo o meu sigilo fiscal, bancário e econômico, em geral. revelei tudo o que foi de interesse da Justiça, estou sendo processado criminalmente.

Exercitarei todo o meu direito de defesa e arrependido aceitarei e cumprirei a decisão que me for imposta pela Justiça. estou pronto para dar a minha contribuição para ajudar a mudar esse país, acreditando que no fim o bem sempre vence o mal.


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