Segundo CNJ, magistrada era amiga e chegou a inocentar o traficante
Diário do Poder
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu, por unanimidade, "condenar" a aposentadoria compulsória, punição máxima prevista na Lei Orgânica da Magistratura, a juíza Olga Regina de Souza Santiago, do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA) pelo "envolvimento, recebimento de valores e troca de favores" com o traficante colombiano Gustavo Duran Bautista.
Juíza Olga Regina de Souza Santiago, do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) |
O voto pela aposentadoria compulsória foi dado pelo conselheiro do CNJ Norberto Campelo em um processo administrativo disciplinar (PAD) que passou a tramitar no CNJ em 2013, e seguido por unanimidade pelos demais membros do Conselho. Paralelamente ao processo administrativo no CNJ, a juíza responde, no tribunal baiano, a uma ação penal em que é acusada do cometimento de vários crimes, entre eles corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A decisão tomada pelo Conselho na 241ª Sessão Ordinária desta terça-feira também será encaminhada ao Ministério Público.
A relação de amizade da magistrada e seu companheiro, Baldoíno Dias de Santana, com Bautista foi comprovada pela operação São Francisco, iniciada em agosto de 2007 pela Polícia Federal, por meio de interceptações telefônicas e mensagens eletrônicas, Segundo Campelo, a relação começou em 2001, quando Olga inocentou Bautista, líder colombiano de uma quadrilha internacional, em uma ação criminal. Na ocasião da prisão, Bautista havia sido preso em flagrante por tráfico de drogas e suspeita de trabalho escravo durante uma inspeção realizada pela Polícia Federal na Fazenda Mariad, de propriedade do traficante. A título de retribuição, em 2006 o traficante teria depositado R$ 14.800,00 para a magistrada e não chegou a pagar outras parcelas combinadas porque foi preso.
No voto, Campelo explica que esta não foi a única iniciativa tomada por Olga para livrar Bautista. A magistrada teria também se esforçado para “limpar” o nome do traficante indo pessoalmente à Polícia Federal. “Além de todos esses favores, cuidou para que Gustavo tivesse notícia de tais providências diretamente por ela, passando-lhe as informações por telefone”, diz o voto.
Império internacional
As investigações realizadas no Brasil indicam que Bautista, empresário especializado na exportação de frutas, é proprietário de mais de cinco fazendas no Brasil e no exterior, tendo montado um verdadeiro império com a renda auferida do narcotráfico. Na Europa, ele é proprietário de empresas de importação e exportação – Eurosouth International BV e South American Fruit BV – que eram utilizadas como destinatárias da droga enviada ao continente.
Segundo relatos da polícia incluídos no voto, em 2006 Bautista adquiriu uma fazenda na Bolívia para armazenar cocaína e uma no Uruguai, no valor de US$ 3 milhões, onde desembarcou a droga apreendida. Em 2007, Bautista e mais seis pessoas foram presas no Uruguai quando descarregavam 500kg de cocaína pura.
Repasse de valores
O repasse de valores de Bautista para Olga se deu de duas formas: entrega de envelopes com dinheiro pessoalmente e transferências bancárias. Além disso, conforme informações que constam no voto do conselheiro, para tentar justificar o recebimento de dinheiro do narcotraficante, a magistrada elegeu a tese de que, em uma de suas idas em Itacaré, Gustavo Duran Bautista teria telefonado para Baldoíno e aparecido no local, onde passou quase um dia inteiro.
Nesta visita, Bautista se interessou em adquirir a casa de veraneio onde estavam, pertencente a seu filho, sendo ajustado o preço de R$ 160 mil. O contrato particular de compromisso de compra e venda do imóvel do filho da investigada em Itacaré é tratada pelo Ministério Público como lavagem de dinheiro na denúncia oferecida perante o TJBA. “Não se entende como um imóvel adquirido em maio de 2002 por R$ 15 mil, conforme escritura pública já mencionada, tenha sido vendido em 10 de janeiro de 2006 por R$ 160 mil”, diz o conselheiro.
Conduta incompatível
Ao decidir pela pena de aposentadoria compulsória, o entendimento do conselheiro Norberto Campelo, que foi seguido por unanimidade pelo plenário do CNJ, foi de que não se pode acolher a tese de boa-fé nas relações com o narcotraficante alegada pela juíza, considerando, especialmente, que ela havia julgado um processo em que o referido senhor fora acusado de tráfico de drogas. “As condutas apuradas mostram-se absolutamente incompatíveis com a dignidade, a honra e o decoro das funções de magistrada, o que gera descrédito não só em sua atuação funcional, como também refletem de forma a macular a imagem de toda a magistratura”, disse o conselheiro Norberto Campelo. Para ele, a juíza feriu de morte o princípio da integridade, que deve ser observado inclusive, em sua vida particular.
A juíza Olga Regina de Souza Santiago já havia sido afastada de suas atividades desde a abertura do processo disciplinar no TJBA em 2008. Posteriormente, por motivos de invalidez, ela foi aposentada, mas, agora, com a decisão do CNJ, poderá ter a revisão do benefício recebido, com proventos proporcionais ao tempo de serviço.
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