Ministério Público do Trabalho acusou, em ação judicial, Grupo de oferecer a seus empregados em Angola carne de jiboia como carne vermelha
Julia Affonso, Fausto Macedo, Mateus Coutinho e Luiz Vassallo | O Estado de S.Paulo
O Ministério Público do Trabalho informou nesta sexta-feira, 17, que fechou com o Grupo Odebrecht, no Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, um acordo no valor de R$ 30 milhões para encerrar ação por trabalho escravo. Segundo o Ministério Público, é o maior processo de trabalho escravo do País e tramita na Justiça do Trabalho desde 2014.
O inquérito contra a Odebrecht foi instaurado pelo procurador Rafael de Araújo Gomes a partir da publicação de uma série de reportagens veiculadas pela BBC Brasil, mencionando a existência de ‘inúmeras condenações judiciais reconhecendo a submissão de brasileiros a trabalho degradante em Angola’. Os empregados haviam sido contratados na cidade de Américo Brasiliense (SP).
Em depoimentos prestados à Justiça, os trabalhadores relataram que os ambientes na obra eram ‘muito sujos e os banheiros, distantes do local de trabalho, permaneciam sempre cheios e entupidos, obrigando-os a evacuar no mato’. Os relatos revelam ainda que a água consumida era salobra e a comida, estragada.
Outros depoimentos deram conta de que era consumida uma carne vermelha que se imaginava ser bovina. No entanto, a partir de informações do próprio cozinheiro, os trabalhadores descobriram tratava-se de carne de jiboia. Dentro da cozinha do refeitório era comum a presença de baratas e ratos; depoentes alegaram ter visto um rato morto entre os pratos. Quando um dos operários se deparou com um macaco na cozinha, desistiu de comer no local, pois sabia que o animal seria morto e servido aos trabalhadores como refeição.
“Provas reunidas pelo Ministério Público do Trabalho demonstram que os trabalhadores brasileiros foram também submetidos ao cerceamento de sua liberdade, inclusive mediante a apropriação de documentos com o propósito de serem mantidos confinados no canteiro de obras. Chegando a Angola, o procedimento adotado pela Biocom/Odebrecht era de imediatamente tomar todos os passaportes, documento de identificação indispensável à salvaguarda dos direitos do estrangeiro. Além disso, não era disponibilizado aos trabalhadores qualquer transporte para sair do canteiro de obras, ainda que aos finais de semana e nas folgas”, destacou o Ministério Público do Trabalho.
Além da indenização por danos morais coletivos, a Odebrecht deverá cumprir obrigações impostas na sentença de primeira instância. Constam como rés as empresas Construtora Norberto Odebrecht S.A., Odebrecht Serviços de Exportação S.A. (antes denominada Olex Importação e Exportação S.A.) e Odebrecht Agroindustrial S.A. (antes denominada ETH Bioenergia). Os valores serão pagos em 12 parcelas de R$ 2,5 milhões, a serem destinados para projetos, iniciativas ou campanhas que revertam em benefício da coletividade, mediante aprovação conjunta do Ministério Público do Trabalho, autor da ação civil pública, e do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região.
De acordo com o Ministério Público, constam da conciliação as seguintes obrigações a serem cumpridas pelas rés: deixar de realizar, promover, estimular ou contribuir para a submissão de trabalhadores à condição análoga a de escravo, sob pena de multa de R$ 100 mil por trabalhador; jamais realizar, promover, estimular ou contribuir com o aliciamento nacional ou internacional de trabalhadores, sob pena de multa de R$ 100 mil por trabalhador; não utilizar em seus empreendimentos no exterior mão de obra contratada no Brasil mediante contrato de trabalho enviado ao país estrangeiro sem o visto de trabalho já concedido pelo governo local, sob pena de multa de R$ 60 mil; e não realizar, promover, contribuir ou se aproveitar da intermediação de mão de obra (merchandage), inclusive com o envolvimento de aliciadores, intermediadores ou “gatos”, em desacordo com a lei, salvo em caso de trabalho temporário, sob pena de multa de R$ 50 mil.
“A sentença proferida em 2015 pela 2ª Vara do Trabalho de Araraquara representou a maior condenação de um grupo por trabalho escravo na história da Justiça do Trabalho, no importe de R$ 50 milhões de dano moral coletivo”, afirma o Ministério Público do Trabalho.
Angola
Em depoimentos prestados à Justiça, os trabalhadores relataram que os ambientes na obra eram ‘muito sujos e os banheiros, distantes do local de trabalho, permaneciam sempre cheios e entupidos, obrigando-os a evacuar no mato’. Os relatos revelam ainda que a água consumida era salobra e a comida, estragada.
Outros depoimentos deram conta de que era consumida uma carne vermelha que se imaginava ser bovina. No entanto, a partir de informações do próprio cozinheiro, os trabalhadores descobriram tratava-se de carne de jiboia. Dentro da cozinha do refeitório era comum a presença de baratas e ratos; depoentes alegaram ter visto um rato morto entre os pratos. Quando um dos operários se deparou com um macaco na cozinha, desistiu de comer no local, pois sabia que o animal seria morto e servido aos trabalhadores como refeição.
“Provas reunidas pelo Ministério Público do Trabalho demonstram que os trabalhadores brasileiros foram também submetidos ao cerceamento de sua liberdade, inclusive mediante a apropriação de documentos com o propósito de serem mantidos confinados no canteiro de obras. Chegando a Angola, o procedimento adotado pela Biocom/Odebrecht era de imediatamente tomar todos os passaportes, documento de identificação indispensável à salvaguarda dos direitos do estrangeiro. Além disso, não era disponibilizado aos trabalhadores qualquer transporte para sair do canteiro de obras, ainda que aos finais de semana e nas folgas”, destacou o Ministério Público do Trabalho.
Além da indenização por danos morais coletivos, a Odebrecht deverá cumprir obrigações impostas na sentença de primeira instância. Constam como rés as empresas Construtora Norberto Odebrecht S.A., Odebrecht Serviços de Exportação S.A. (antes denominada Olex Importação e Exportação S.A.) e Odebrecht Agroindustrial S.A. (antes denominada ETH Bioenergia). Os valores serão pagos em 12 parcelas de R$ 2,5 milhões, a serem destinados para projetos, iniciativas ou campanhas que revertam em benefício da coletividade, mediante aprovação conjunta do Ministério Público do Trabalho, autor da ação civil pública, e do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região.
De acordo com o Ministério Público, constam da conciliação as seguintes obrigações a serem cumpridas pelas rés: deixar de realizar, promover, estimular ou contribuir para a submissão de trabalhadores à condição análoga a de escravo, sob pena de multa de R$ 100 mil por trabalhador; jamais realizar, promover, estimular ou contribuir com o aliciamento nacional ou internacional de trabalhadores, sob pena de multa de R$ 100 mil por trabalhador; não utilizar em seus empreendimentos no exterior mão de obra contratada no Brasil mediante contrato de trabalho enviado ao país estrangeiro sem o visto de trabalho já concedido pelo governo local, sob pena de multa de R$ 60 mil; e não realizar, promover, contribuir ou se aproveitar da intermediação de mão de obra (merchandage), inclusive com o envolvimento de aliciadores, intermediadores ou “gatos”, em desacordo com a lei, salvo em caso de trabalho temporário, sob pena de multa de R$ 50 mil.
“A sentença proferida em 2015 pela 2ª Vara do Trabalho de Araraquara representou a maior condenação de um grupo por trabalho escravo na história da Justiça do Trabalho, no importe de R$ 50 milhões de dano moral coletivo”, afirma o Ministério Público do Trabalho.
Angola
Segundo o Ministério Público do Trabalho, as obras pertenciam à Companhia de Bioenergia de Angola – Biocom, empresa angolana da qual eram sócios a Odebrecht Angola, empresa do grupo multinacional brasileiro Odebrecht; a Sonangol Holdings, vinculada à estatal petrolífera de Angola; e a Damer Industria S.A, companhia privada que tem como sócios dois generais e o vice-presidente de Angola, substituída pela Cochan S.A.
“Provas produzidas na ação demonstraram que, em um momento após o início das obras, a Odebrecht Agroindustrial assumiu a gestão do empreendimento, tornando-se a usina angolana, na prática, uma de suas unidades”, afirma o Ministério Público.
“As provas produzidas nas dezenas de reclamações trabalhistas movidas contra a Odebrecht e a Pirâmide Assistência Técnica, uma prestadora de serviços da Biocom, revelam que os operários envolvidos em montagens industriais trabalhavam em condições análogas às de escravo, particularmente no que se refere a instalações sanitárias, áreas de vivência, alimentação e água para beber.”
O Ministério Público afirma que ‘vários trabalhadores adoeceram em razão das condições a que foram submetidos’.
O processo indica que na obra havia, em média, 400 trabalhadores registrados em Américo Brasiliense pela Pirâmide. Resultados de exames médicos de trabalhadores que retornaram de Angola, encaminhados pelo Departamento Municipal de Saúde da Prefeitura de Américo Brasiliense, apontaram que vários operários apresentaram febre, dor de cabeça, dor abdominal, diarreia, náuseas, fezes com sangue, emagrecimento, e alguns apresentaram suspeita de febre tifoide.
Na audiência de conciliação participaram, pelo Ministério Público do Trabalho, os procuradores Rafael de Araújo Gomes, Ronaldo Lira e Fábio Vieira. Pelo TRT participaram o relator do processo, desembargador Edison dos Santos Pelegrini, o presidente da Corte, Fernando da Silva Borges, o vice-presidente judicial, Edmundo da Silva Lopes, e o presidente do Comitê de Erradicação do Trabalho Escravo do TRT-15, Eduardo Benedito de Oliveira Zanella.
COM A PALAVRA, A ASSESSORIA DA BIOCOM:
“Em resposta ao noticiado, a Biocom (Companhia de Bioenergia de Angola, Lda.) esclarece que, na data de ontem, a Ação Civil Pública iniciada em 13 de junho de 2014 na 2ª Vara do Trabalho de Araraquara foi extinta definitivamente por meio de acordo celebrado com o Ministério Público do Trabalho perante o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região.
A empresa reafirma que zela pelo cumprimento estrito da legislação e respeito às pessoas. Por isso, a premissa para celebração deste acordo foi justamente o fato de que ele não implica em qualquer reconhecimento de prática de trabalho escravo, nem de violação de direitos humanos ou de princípios que regem as relações de trabalho pela empresa.
Embora nenhuma instituição brasileira, ainda que formalmente convidadas, tenha comparecido às instalações da Biocom para fiscalizá-la, as condições de trabalho na empresa sempre foram fiscalizadas e atestadas positivamente por autoridades angolanas (equivalentes ao Ministério do Trabalho e Emprego).
A Empresa é uma das maiores empregadoras de Angola, com aproximadamente 2.100 empregados, sendo 1.940 angolanos, e cumpre rigorosamente a legislação trabalhista vigente.
A BIOCOM nega todas as acusações feitas pela reportagem e reafirma seu compromisso de transparência para com a sociedade se colocando à disposição para quaisquer esclarecimentos que ainda se façam necessários e espera que o valor atribuído no acordo celebrado reverta em benefício da sociedade brasileira.”
“Provas produzidas na ação demonstraram que, em um momento após o início das obras, a Odebrecht Agroindustrial assumiu a gestão do empreendimento, tornando-se a usina angolana, na prática, uma de suas unidades”, afirma o Ministério Público.
“As provas produzidas nas dezenas de reclamações trabalhistas movidas contra a Odebrecht e a Pirâmide Assistência Técnica, uma prestadora de serviços da Biocom, revelam que os operários envolvidos em montagens industriais trabalhavam em condições análogas às de escravo, particularmente no que se refere a instalações sanitárias, áreas de vivência, alimentação e água para beber.”
O Ministério Público afirma que ‘vários trabalhadores adoeceram em razão das condições a que foram submetidos’.
O processo indica que na obra havia, em média, 400 trabalhadores registrados em Américo Brasiliense pela Pirâmide. Resultados de exames médicos de trabalhadores que retornaram de Angola, encaminhados pelo Departamento Municipal de Saúde da Prefeitura de Américo Brasiliense, apontaram que vários operários apresentaram febre, dor de cabeça, dor abdominal, diarreia, náuseas, fezes com sangue, emagrecimento, e alguns apresentaram suspeita de febre tifoide.
Na audiência de conciliação participaram, pelo Ministério Público do Trabalho, os procuradores Rafael de Araújo Gomes, Ronaldo Lira e Fábio Vieira. Pelo TRT participaram o relator do processo, desembargador Edison dos Santos Pelegrini, o presidente da Corte, Fernando da Silva Borges, o vice-presidente judicial, Edmundo da Silva Lopes, e o presidente do Comitê de Erradicação do Trabalho Escravo do TRT-15, Eduardo Benedito de Oliveira Zanella.
COM A PALAVRA, A ASSESSORIA DA BIOCOM:
“Em resposta ao noticiado, a Biocom (Companhia de Bioenergia de Angola, Lda.) esclarece que, na data de ontem, a Ação Civil Pública iniciada em 13 de junho de 2014 na 2ª Vara do Trabalho de Araraquara foi extinta definitivamente por meio de acordo celebrado com o Ministério Público do Trabalho perante o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região.
A empresa reafirma que zela pelo cumprimento estrito da legislação e respeito às pessoas. Por isso, a premissa para celebração deste acordo foi justamente o fato de que ele não implica em qualquer reconhecimento de prática de trabalho escravo, nem de violação de direitos humanos ou de princípios que regem as relações de trabalho pela empresa.
Embora nenhuma instituição brasileira, ainda que formalmente convidadas, tenha comparecido às instalações da Biocom para fiscalizá-la, as condições de trabalho na empresa sempre foram fiscalizadas e atestadas positivamente por autoridades angolanas (equivalentes ao Ministério do Trabalho e Emprego).
A Empresa é uma das maiores empregadoras de Angola, com aproximadamente 2.100 empregados, sendo 1.940 angolanos, e cumpre rigorosamente a legislação trabalhista vigente.
A BIOCOM nega todas as acusações feitas pela reportagem e reafirma seu compromisso de transparência para com a sociedade se colocando à disposição para quaisquer esclarecimentos que ainda se façam necessários e espera que o valor atribuído no acordo celebrado reverta em benefício da sociedade brasileira.”
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