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Troca internacional

Correio Braziliense

O episódio do desaparecimento de Edmur Péricles Camargo é um exemplo da perseguição política e cooperação sistemática internacional iniciada pela ditadura brasileira. Vários informes revelam que Gauchão trabalhava na instalação de uma base de guerrilhas na Bolívia. Seu contato lá era o chefe guerrilheiro boliviano “Chato” Peredo, um dos subversivos mais procurados naquele país. Em junho de 1971, Péricles Camargo deixou Santiago do Chile com destino a Buenos Aires para um tratamento ocular — as torturas a que fora submetido nos porões do DOPS de São Paulo teriam comprometido sua visão.

Desembarcou no aeroporto internacional de Ezeiza, onde foi detido numa operação entre autoridades policiais brasileiras e argentinas, com base nas informações do Ciex e o apoio de informantes infiltrados na companhia aérea LAN-Chile. O desaparecimento de Gauchão foi oficialmente registrado como ocorrido em 1975, apenas quatro anos depois. Edmur viajava com o nome falso de Henrique Vilaça. Seu paradeiro permanece desconhecido.

O informe 133/71 dá a entender que o desaparecimento de Gauchão teve o objetivo de evitar que ele executasse um possível elemento infiltrado do regime. “Os setenta banidos, agora reduzidos a 62, com a viagem de oito membros, continuariam desconfiados de que um deles é elemento infiltrado, com a finalidade de espioná-los. Desconfiam de um elemento, que seria o asilado João Batista Rita.

Edmur Péricles Camacho (Gauchão) e outros mais desejariam mesmo assassinar o referido banido”, aponta o documento.

A troca de informações entre o Ciex e agências de outros países levou à localização de membros de movimentos de esquerda em todo o mundo: Motoneros (Argentina), Tupamaros (Uruguai), MIR (Chile), além de partidos de tendência socialista. Também foram perseguidos funcionários de empresas e autoridades. O informe 151/71 identifica uma célula esquerdista no Banco do Brasil em Montevidéu.

“Na agência havia sido organizada uma célula da esquerda radical (FER ou MLN), descoberta pela polícia uruguaia, quando seus membros realizavam uma reunião clandestina na Escola Pública/171, em Billa Garcia (km.21 do Camino Maldonado, Montevidéu)”, diz o documento. Logo, seriam presos Ary Cabrera Prates, Rubén Julio Vaneiro Roso e Luis Alberto Chemi de Mello, três funcionários do Banco do Brasil.

Resto do mundo

Informações estratégicas obtidas pelos serviços de inteligência ou pela polícia nacional de outros países subsidiaram operações de monitoramento e prisão também de cidadãos comuns. Isso aconteceu com um caderno de endereços pertencente ao dirigente da esquerda peronista Mario Vallota, confiscado pelo serviço secreto francês e depois encaminhado ao Ciex por meio da embaixada na França. No caderno estava o paradeiro de pelo menos 20 pessoas. O informe 142/71 mostra que, de posse das informações, o agente diplomático identifica os personagens e sua relação com a subversão: “Josée Utard, citada sob o número 12, pode ser Maria Josée Utard, que em Paris servia até DEZ/69, de elemento de ligação entre Miguel Arraes e a embaixada de Cuba. Claude Julien, citado sob o número 6, é jornalista e escritor ligado a Marcel Niedergang e a Miguel Arraes. O codinome ‘Jacques’ indicaria um contato com o Partido Comunista Francês”, explica um agente do CIex.

Num outro caso, a polícia italiana apreendeu a agenda de um membro da chamada “Frente Brasileira de Informações” — organização destinada à propaganda internacional contra a ditadura brasileira. O livreto continha o endereço residencial e comercial de 54 pessoas, e foi devidamente encaminhado ao Ciex. Os relatos continham até números de telefones. Em muitos casos, as informações motivaram batidas policiais, revistas e detenções. A prisão de Jefferson Cardim Allencar Osório no final de 1970 rendeu ao serviço secreto do Itamaraty uma longa lista de contatos do subversivo em lugares como Alemanha Ocidental, Paris, Guiana, Montevidéu, Santiago do Chile, Havana e até no Pará. (CDS)

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