O deputado federal e pré-candidato à presidência Jair Bolsonaro, do Partido Social Liberal (PSL), gerou polêmica nesta semana ao afirmar que, se eleito, pretende retirar a Embaixada da Palestina do Brasil, uma vez que não considera a Palestina um país, embora Brasília tenha a reconhecido como Estado independente em 2010.
Sputnik
Segundo o político, que já defendeu inúmeras vezes a aproximação do Brasil com Israel, a instalação do prédio na capital federal, em 2016, seria resultado de uma negociação da ex-presidenta Dilma Rousseff com terroristas, numa espécie de "puxadinho".
Jair Bolsonaro (PSL) © AFP 2018/ Nelson Almeida |
"A Dilma negociou com a Palestina e não com o povo de lá. Você não negocia com terrorista, então, aquela embaixada do lado do (Palácio do) Planalto, ali não é área para isso", afirmou o deputado, citado pelo Estadão.
Indignado com as declarações do deputado em relação ao seu país de origem, o presidente do Centro Cultural Árabe-Brasileiro, o empresário Ahmed Ramadan, disse em entrevista à Sputnik Brasil que o posicionamento do candidato do PSL em relação à Palestina reflete claramente a influência israelense sobre sua candidatura, uma evidente troca de interesses. Para ele, Bolsonaro, ao se envolver em polêmicas como essa, demonstra não entender a profundidade dos laços brasileiros não apenas com os palestinos, mas também com toda a comunidade árabe e muçulmana em geral.
"O Brasil é muito amado pelo povo árabe. Tem relações comerciais, esportivas, relação cultural com o Brasil. Aliás, a colônia árabe aqui no Brasil é muito forte. Mais ou menos, entre 20% e 30% dos brasileiros são descendentes de árabes [na realidade, segundo dados extraoficiais, 0,48% da população total se declaram de ascendência árabe]. Não tem nenhum brasileiro que não tenha boas relações com árabes, de amizade ou descendência", afirmou Ahmed, acusando o parlamentar de querer fechar as portas do Brasil para os países árabes em troca do apoio de Israel, o que, segundo ele, prejudicaria até a economia brasileira.
Também de acordo com o empresário, Bolsonaro vem mostrando com suas atitudes não estar preparado para se tornar presidente da República.
"Ele, realmente, esse candidato, ele não tem cultura, ele precisa estudar. Precisa ter alguns assessores bem esclarecidos, que conheçam as causas, as relações. Está muito fraco, como presidente, nesse lado."
Sobre a decisão do chefe de Estado norte-americano de transferir a Embaixada dos Estados Unidos em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, provocando revoltas da população árabe e muçulmana mundo afora, Ahmed Ramadan acredita que Donald Trump atrapalhou muito a relação dos EUA com outros países após essa manobra. Para ele, Jair Bolsonaro poderia seguir o mesmo caminho, principalmente se adotar uma medida parecida.
"Mesma coisa. Ele quer destruir todas as relações do Brasil com o mundo árabe e países muçulmanos. Se ele passa a Embaixada do Brasil para Jerusalém, não vai ser só através dos palestinos um problema, nem mundo árabe, mas para todos os muçulmanos. Ele vai criar muitos problemas para o Brasil."
Segundo o cientista político Samuel Feldberg, professor de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (USP) e personalidade de destaque na colônia judaica paulista, do ponto de vista legal, a posição de Bolsonaro sobre a Palestina tem certo embasamento lógico, e, na qualidade de presidente, ele poderia, provavelmente, tomar essa decisão em relação à embaixada sem "romper relações diplomáticas com um Estado que ainda não existe".
"Em 2011, foi solicitada a inclusão da Palestina como Estado-membro das Nações Unidas. Como essa solicitação tem que ser aprovada tanto pelo Conselho de Segurança quanto pela Assembleia-Geral — e havia uma forte probabilidade de os Estados Unidos vetarem esse pedido no Conselho de Segurança —, então, em 2012, não coincidentemente, no dia 29 de novembro, no aniversário da partilha de 1947, a Assembleia-Geral aceitou a Palestina como um Estado observador não membro. Portanto, a representação palestina participa das assembleias das Nações Unidas, mas eles não têm um status de um Estado como os outros membros das Nações Unidas", afirmou o especialista.
Para Feldberg, a transferência da Embaixada do Brasil de Tel Aviv para Jerusalém, cidade sagrada para judeus, cristãos e muçulmanos e disputada por israelenses e palestinos, em um eventual governo de Jair Bolsonaro, não deve ser considerada improvável. Segundo ele, no entanto, hoje, as relações do Brasil com Israel já são muito melhores do que costumavam ser e, se eleito, é possível que Bolsonaro tenha "pouco a agregar" nesse sentido.
"As relações entre Brasil e Israel estão nos melhores níveis desde a época do governo Fernando Henrique. Elas são fluidas, há uma série de interesses comuns em ampliar as relações econômicas, culturais e, portanto, o candidato Bolsonaro teria pouco, talvez, a agregar para a melhora dessas relações nesse momento."
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