Sports

'É preciso ser breve; mensalão pode prescrever'

Novo presidente do STF quer julgamento até 6 de julho para não haver risco de caso ser atropelado pelo calendário eleitoral

FELIPE RECONDO / BRASÍLIA - O Estado de S.Paulo

Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) a partir de quinta-feira, o ministro Carlos Ayres Britto afirma que trabalhará pela realização do julgamento do processo do mensalão ainda no primeiro semestre deste ano. Britto reconhece que a eventual demora coloca o processo em risco de prescrição. "Como presidente, seja quem for, é preciso julgar com brevidade, porque há o risco de prescrição", afirma.

Na prática, a possibilidade de prescrição ameaça mais os casos que receberem penas baixas do Supremo. A prescrição do processo vai valer conforme a pena aplicada a partir da data em que a denúncia foi recebida pela Corte. Isso ocorreu em 2007. Então, se um dos investigados for condenado a uma pena baixa, ela já poderá estar prescrita quando o julgamento terminar.

Na avaliação do futuro presidente do STF, se o processo não estiver julgado até o dia 6 de julho, será difícil julgá-lo antes das eleições. Até mesmo pelo perfil da composição do Supremo, que possui seis integrantes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e que estarão sobrecarregados com os casos envolvendo os pleitos municipais. "Seis ministros daqui são ministros do Eleitoral. Não vamos parar a Justiça Eleitoral para julgar o mensalão", diz.

A seguir, os principais trechos da entrevista.

O que o sr. fará para acelerar o julgamento do mensalão?

Colocá-lo em pauta com brevidade. O que me cabe é publicar a pauta imediatamente. Como presidente, seja quem for, é preciso julgar com brevidade, porque há o risco de prescrição. O próprio ministro (Ricardo) Lewandowski disse que há o risco de prescrição. E há. Então, seja quem for o presidente, terá de julgar com brevidade.

Quanto tempo levaria para que o caso fosse julgado?

Regimentalmente, você só pode julgar um processo se a pauta do julgamento estiver publicada 48 horas antes da sessão. Conversarei com o ministro Joaquim Barbosa, que é o relator, para saber se posso chamar o processo na primeira sessão depois da publicação. Se disser que sim, chamarei o processo na primeira sessão seguinte à publicação da pauta.

De que forma a pressão da opinião pública é recebida pelo Supremo?

Colocar para julgar com brevidade não significa prejulgamento, predisposição para a condenação. Nós aqui não perderemos nossa característica central da imparcialidade, da objetividade. Metaforicamente: nem raja de sangue no olho nem buquê de flores nas mãos.

Alguns ministros defendem o julgamento depois das eleições. O que o sr. acha?

Como se trata de ano eleitoral, é evidente, é patente que, se for possível, é melhor julgar o processo do mensalão antes do dia 6 de julho, porque não teremos dois processos importantes tramitando em paralelo (as eleições municipais e o mensalão). Seis ministros daqui são também ministros do Eleitoral (Tribunal Superior Eleitoral). Nós não vamos parar a Justiça Eleitoral para julgar o mensalão.

Esse processo é diferente dos demais?

Do ponto de vista do nosso dever de julgar, ele é igual aos outros. Absolutamente igual. Devemos vê-lo com objetividade, com imparcialidade, analisando criteriosamente as provas, o voto do relator, as sustentações orais, tudo. Para nós, não é um processo diferente dos outros.

Em quanto tempo poderemos ver um réu do processo do mensalão condenado começando a cumprir pena?

Aí temos que cumprir a lei, cumprir os prazos processuais. Isso pode demorar meses.

O sr. tem ideia de quanto tempo?

Não podemos passar a tesoura nesses prazos. Eu nem me pergunto isso. Se houver condenação, seguimos os trâmites.

O sr. é crítico da impunidade dos crimes de colarinho branco. Como fará para mudar isso?

Dando prioridade ao julgamento dos crimes desta natureza. E dar prioridade é cumprir a Constituição, que também dá prioridade a esse combate.

Alguns tribunais têm números irrisórios de condenações por improbidade. O sr. Estabelecerá meta para julgamento desses processos?

Sim, eu pretendo criar uma espécie de programa. Essa prioridade decorre da própria Constituição. O que fazer para mudar o cenário, a sensação de impunidade? Tornando mais eficaz o combate à impunidade em termos de ações de improbidade administrativa e matérias congêneres, como corrupção. Eu levarei para o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) essa proposta para cerrarmos fileira para o cumprimento da Constituição. O parágrafo 5.º do artigo 37 é a cereja do bolo: para quem assalta o erário, a resposta mais severa do Estado é o ressarcimento. Por que alguém que assalta o erário pode planejar ficar cinco anos preso e depois sair e buscar o dinheiro? Porque o Estado não foi buscá-lo de volta.

O sr. disse que o Judiciário não é uma caixa-preta. Com tudo o que o CNJ tem mostrado, o sr. considera que não é realmente uma caixa-preta?

Não é uma caixa-preta. Eu trabalho com características centrais. O Judiciário tem caixa dois como característica central? Não tem.

O CNJ identificou pagamentos fora da folha dos tribunais e benefícios incompatíveis com a lei. Isso não é comparável a caixa dois?

Isso não é característica do Judiciário. Se aconteceu é pontual. O Judiciário, como estrutura, não pratica isso. Honestamente, o Brasil tem um Poder Judiciário de qualidade, é preparadíssimo tecnicamente.

Nosso Judiciário é de uma devoção incomparável. Ninguém trabalha tanto quanto os membros do Poder Judiciário. Tanto que é proibido pagar hora extra. Porque não haveria orçamento que suportasse. Como característica central, o Judiciário é de orgulhar o Brasil.

Mas e os casos identificados pelo CNJ?

Defecções há aqui e ali. E, quando forem identificadas, devem ser tratadas com toda a brevidade e com o rigor cabível.

O que é pior: um parlamentar que loteia seu mandato ou um juiz que vende sentença?

O juiz que vende sentença. Nem penso para responder isso. Por uma razão simples. O poder que controla os outros não pode se descontrolar; o poder que impede os desmandos não pode se desmandar; o poder que impede o desgoverno não pode se desgovernar.

O sr. é a favor do fim das férias de dois meses, auxílio-moradia, auxílio-alimentação e outros penduricalhos para os magistrados?

Eu vou rediscutir isso a partir do CNJ. Vou colocar essa matéria lá. Pegar as prerrogativas da magistratura e submeter ao crivo do CNJ. Não é que seja a favor ou contra.

E a possibilidade de juízes venderem parte de suas férias de 60 dias?

Se você vende as férias, é porque não precisa delas. As férias têm uma função médico-social. Você precisa de férias para sair da rotina, para se recompor fisicamente.

O sr. vai trabalhar pelo reajuste dos salários de magistrados e servidores?

Sim. Farei isso a partir do CNJ para tirar qualquer ranço de corporativismo nesse retomar de tratativas. Quero fazer comparação de níveis remuneratórios entre os três Poderes, inclusive entre os membros dos Poderes. O fato é que a magistratura reclama dos atuais subsídios. E diz mais: nos últimos sete anos houve uma perda no poder aquisitivo de 35%.

Isso será discutido ao mesmo tempo em que analisam o fim de penduricalhos?

Sim. Tudo tem que ser discutido. Pretendo retomar a discussão a partir de dados colhidos pelo CNJ. Compete ao CNJ zelar pela autonomia do Judiciário, autonomia política, administrativa, orçamentária e remuneratória. O papel do CNJ não é só  exercer funções correcionais, é zelar pela autonomia do Judiciário.

Como o sr. avalia o momento atual da imprensa?

A liberdade de imprensa, quando em plenitude, insufla, estimula na população uma curiosidade pelas coisas do poder. E é o que está havendo. Todo mundo quer saber de tudo. E tudo está vindo a lume. É uma fase que entendo como riquíssima da história do Brasil. A cultura do biombo foi excomungada. Os jornalistas estão a mil para levantar tapetes, ver se há poeira debaixo deles e saber quem foi que a colocou lá. Isso é sinal dos tempos. As coisas estão mudando.

Previous article
Next article
TREs rejeitam conta de 23 deputados federais
Os altos salários do funcionalismo entraram na agenda
Assembléia de ES absolve acusados por "mensalinho capixaba"

Leave Comments

Ads

Ads 2

Ads Tengah Artikel 2